27.março.25
Crescimento
"Crescei na graça e no conhecimento de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo." — 2 Pedro 3:18.
O tema do texto que encabeça esta página é um que não ouso omitir neste volume sobre a Santidade. É um tema que deveria ser profundamente interessante para todo verdadeiro cristão. Ele naturalmente levanta as perguntas: Estamos crescendo na graça? Estamos progredindo em nossa religião? Estamos avançando?
Para um cristão meramente formal, não posso esperar que esta indagação pareça digna de atenção. O homem que não possui mais do que um tipo de religião dominical — cujo cristianismo é como suas roupas de domingo, usadas uma vez por semana e depois guardadas — tal homem, é claro, não pode ser esperado que se importe com "crescer na graça". Ele nada sabe sobre tais assuntos. "Eles são loucura para ele." (1 Coríntios 2:14.) Mas para todo aquele que está genuinamente sério quanto à sua alma, e que tem fome e sede de vida espiritual, a pergunta deveria chegar com um poder investigativo. Estamos progredindo em nossa religião? Estamos crescendo?
A pergunta é sempre útil, mas especialmente em certas ocasiões. Uma noite de sábado, um domingo de Ceia do Senhor, o retorno de um aniversário, o fim de um ano — todos estes são momentos que deveriam nos levar a refletir e a olhar para dentro. O tempo está voando rapidamente. A vida está escoando. A cada dia a hora se aproxima em que a realidade de nosso cristianismo será testada, e se verá se edificamos "sobre a rocha" ou "sobre a areia". Certamente nos convém, de tempos em tempos, examinar a nós mesmos e fazer um balanço de nossas almas. Estamos progredindo nas coisas espirituais? Estamos crescendo?
A pergunta é de especial importância nos dias de hoje. Opiniões cruas e estranhas estão circulando nas mentes dos homens sobre alguns pontos de doutrina, e entre outros, sobre o ponto de "crescer na graça" como parte essencial da verdadeira santidade. Por alguns, isso é totalmente negado. Por outros, é distorcido e reduzido a nada. Por milhares, é mal compreendido e, consequentemente, negligenciado. Em um dia como este, é útil encarar francamente todo o assunto do crescimento cristão.
Ao considerar este tema, há três pontos que desejo apresentar e estabelecer:
I. A realidade do crescimento religioso. Existe tal coisa como "crescimento na graça".
II. As marcas do crescimento religioso. Existem marcas pelas quais o "crescimento na graça" pode ser reconhecido.
III. Os meios do crescimento religioso. Existem meios que devem ser usados por aqueles que desejam o "crescimento na graça".
Não sei quem é você, em cujas mãos este escrito possa ter caído. Mas não tenho vergonha de pedir sua melhor atenção ao seu conteúdo. Acredite, o assunto não é mera questão de especulação e controvérsia. É um tema eminentemente prático, se é que há algum na religião. Está intimamente e inseparavelmente ligado à questão da "santificação". É uma marca principal dos verdadeiros santos que eles crescem. A saúde e prosperidade espiritual, a felicidade e o conforto espiritual de todo cristão sincero e santo estão intimamente ligados ao tema do crescimento espiritual.
I. O primeiro ponto que proponho estabelecer é este: Existe tal coisa como crescimento na graça.
Que qualquer cristão negue esta proposição é, à primeira vista, algo estranho e melancólico. Mas é justo lembrar que o entendimento do homem caiu, assim como sua vontade. Divergências sobre doutrinas frequentemente não são mais do que divergências sobre o significado das palavras. Tento esperar que este seja o caso presente. Tento acreditar que, quando falo de "crescimento na graça" e o defendo, quero dizer uma coisa, enquanto meus irmãos que o negam querem dizer outra completamente diferente. Portanto, permita-me abrir caminho explicando o que quero dizer.
Quando falo de "crescimento na graça", não quero dizer, nem por um momento, que o interesse de um crente em Cristo possa crescer. Não quero dizer que ele possa crescer em segurança, aceitação diante de Deus ou garantia. Não quero dizer que ele possa ser mais justificado, mais perdoado, mais absolvido, ou mais em paz com Deus do que já está no primeiro momento em que crê. Sustento firmemente que a justificação de um crente é uma obra concluída, perfeita e completa; e que o mais fraco dos santos, ainda que possa não saber ou sentir isso, está tão completamente justificado quanto o mais forte. Sustento firmemente que nossa eleição, vocação e posição em Cristo não admitem graus, aumento ou diminuição. Se alguém imagina que, ao falar de "crescimento na graça", estou me referindo a crescimento na justificação, está completamente fora de propósito e equivocado quanto ao ponto que estou considerando. Eu iria até a fogueira, com a ajuda de Deus, por essa gloriosa verdade: que, no que diz respeito à justificação diante de Deus, todo crente está "completo em Cristo" (Col. ii. 10). Nada pode ser acrescentado à sua justificação desde o momento em que ele crê, e nada pode ser tirado.
Quando falo de "crescimento na graça", quero dizer apenas aumento no grau, tamanho, força, vigor e poder das graças que o Espírito Santo planta no coração de um crente. Sustento que cada uma dessas graças admite crescimento, progresso e aumento. Sustento que o arrependimento, a fé, a esperança, o amor, a humildade, o zelo, a coragem e semelhantes podem ser pequenos ou grandes, fortes ou fracos, vigorosos ou débeis, e podem variar grandemente na mesma pessoa em diferentes períodos de sua vida. Quando falo de um homem "crescendo na graça", quero dizer simplesmente isto: que o seu senso de pecado está se aprofundando, sua fé se fortalecendo, sua esperança se tornando mais brilhante, seu amor se tornando mais abrangente, sua mentalidade espiritual se tornando mais evidente. Ele sente mais o poder da piedade em seu próprio coração. Ele manifesta mais disso em sua vida. Ele está prosseguindo de força em força, de fé em fé, e de graça em graça. Deixo a outros descreverem a condição de tal homem com as palavras que quiserem. Para mim, penso que a descrição mais verdadeira e melhor dele é esta: ele está "crescendo na graça".
Um dos principais fundamentos sobre o qual baseio esta doutrina do "crescimento na graça" é a linguagem clara da Escritura. Se as palavras da Bíblia significam algo, há sim tal coisa como "crescimento", e os crentes devem ser exortados a "crescer". — O que diz São Paulo? "A vossa fé cresce muitíssimo" (2 Tess. i. 3). "Rogamo-vos que aumenteis cada vez mais" (1 Tess. iv. 10). "Crescendo no conhecimento de Deus" (Col. i. 10). "Tendo esperança de que, à medida que cresce a vossa fé" (2 Cor. x. 15). "O Senhor vos faça crescer em amor" (1 Tess. iii. 12). "Cresçamos n'Ele em todas as coisas" (Efé. iv. 15). "Peço que o vosso amor aumente mais e mais" (Fil. i. 9). "Rogamo-vos que, assim como recebestes de nós como convém andar e agradar a Deus, assim abundeis cada vez mais" (1 Tess. iv. 1). — O que diz São Pedro? "Desejai, como meninos recém-nascidos, o leite racional, não falsificado, para que por ele vades crescendo" (1 Ped. ii. 2). "Crescei na graça e no conhecimento de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo" (2 Ped. iii. 18). Não sei o que outros pensam sobre tais textos. Para mim, parecem estabelecer a doutrina pela qual contendo, e ser incapazes de qualquer outra explicação. O crescimento na graça é ensinado na Bíblia. Eu poderia parar aqui e não dizer mais nada.
Entretanto, o outro fundamento sobre o qual baseio a doutrina do "crescimento na graça" é o fundamento do fato e da experiência. Pergunto a qualquer leitor honesto do Novo Testamento se ele não pode ver graus de graça nos santos do Novo Testamento, cujas histórias são registradas, tão claramente quanto se vê o sol ao meio-dia. — Pergunto se ele não pode ver nas mesmas pessoas diferenças tão grandes entre a fé e o conhecimento em um momento e em outro, como entre a força de um homem quando é um bebê e quando é adulto. — Pergunto se a Escritura não reconhece distintamente isso na linguagem que usa, ao falar de "fé fraca" e "fé forte", e dos cristãos como "meninos recém-nascidos", "filhinhos", "jovens" e "pais" (1 Ped. ii. 2; 1 João ii. 12-14). Pergunto, acima de tudo, se sua própria observação dos crentes, nos dias de hoje, não o leva à mesma conclusão. — Que verdadeiro cristão não confessaria que há tanta diferença entre o grau de sua fé e conhecimento no momento da sua conversão e seus atuais progressos, quanto há entre uma muda e uma árvore plenamente crescida? Suas graças são as mesmas em princípio; mas cresceram. Não sei como esses fatos impressionam outros; para mim, eles parecem provar, de maneira irrefutável, que o "crescimento na graça" é algo real.
Sinto-me quase envergonhado de me deter tanto nesta parte do meu assunto. De fato, se algum homem pretende dizer que a fé, a esperança, o conhecimento e a santidade de uma pessoa recém-convertida são tão fortes quanto os de um crente antigo e estabelecido, e que não precisam de crescimento, é perda de tempo continuar a argumentar. Sem dúvida, eles são tão reais, mas não tão fortes — tão verdadeiros, mas não tão vigorosos — tão verdadeiramente sementes plantadas pelo Espírito, mas ainda não tão frutíferos. E se alguém perguntar como eles podem se tornar mais fortes, eu digo que deve ser pelo mesmo processo pelo qual todas as coisas que têm vida crescem — eles devem crescer. E é isso que quero dizer com "crescimento na graça" [1].
Vamos deixar de lado as questões que estive discutindo para uma visão mais prática do grande tema diante de nós. Quero que os homens vejam o "crescimento na graça" como algo de importância infinita para a alma. Acredito, independentemente do que outros possam pensar, que nossos melhores interesses estão envolvidos numa visão correta da questão — Estamos crescendo?
(a) Saibamos então que o "crescimento na graça" é a melhor evidência de saúde espiritual e prosperidade. Em uma criança, uma flor ou uma árvore, todos nós sabemos que, quando não há crescimento, há algo errado. A vida saudável em um animal ou vegetal sempre se manifestará por progresso e aumento. É exatamente o mesmo com nossas almas. Se elas estão progredindo e indo bem, elas crescerão [2].
(b) Saibamos, além disso, que o "crescimento na graça" é um meio de ser feliz em nossa religião. Deus sabiamente ligou nosso conforto e nosso progresso em santidade. Graciosamente, Ele fez com que fosse de nosso interesse avançar e almejar altos ideais em nosso cristianismo. Há uma enorme diferença entre a quantidade de gozo sensível que um crente experimenta em sua religião em comparação com outro. Mas pode ter certeza de que, ordinariamente, o homem que sente mais "alegria e paz em crer" e tem o testemunho mais claro do Espírito em seu coração é o homem que cresce.
(c) Saibamos, além disso, que o "crescimento na graça" é um dos segredos da utilidade para os outros. Nossa influência para o bem sobre os outros depende grandemente do que eles veem em nós. Os filhos do mundo medem o cristianismo tanto pelos olhos quanto pelos ouvidos. O cristão que está sempre parado, aparentemente o mesmo homem, com os mesmos pequenos defeitos, fraquezas, pecados dominantes e enfermidades, raramente é o cristão que faz muito bem. O homem que agita e desperta as mentes, e faz o mundo pensar, é o crente que está continuamente melhorando e avançando. Os homens acreditam que há vida e realidade quando veem crescimento [3].
(d) Saibamos, além disso, que o "crescimento na graça" agrada a Deus. Pode parecer algo maravilhoso, sem dúvida, que qualquer coisa feita por criaturas como nós possa dar prazer ao Deus Altíssimo. Mas é assim. A Escritura fala sobre andar de modo a "agradar a Deus". A Escritura diz que há sacrifícios com os quais "Deus se agrada". (1 Tess. iv. 1; Heb. xiii. 16.) O agricultor ama ver as plantas nas quais trabalhou florescendo e dando frutos. Não pode deixar de se decepcionar e se entristecer ao vê-las atrofiadas e paradas. Agora, o que nosso próprio Senhor diz? "Eu sou a videira verdadeira, e meu Pai é o lavrador." — "Nisto é glorificado meu Pai: que deis muito fruto; e assim sereis meus discípulos." (João xv. 1, 8.) O Senhor se agrada de todo o Seu povo — mas especialmente daqueles que crescem.
(e) Saibamos, acima de tudo, que o "crescimento na graça" não é apenas algo possível, mas algo pelo qual os crentes são responsáveis. Dizer a um homem não convertido, morto em delitos e pecados, para "crescer na graça" seria sem dúvida absurdo. Mas dizer a um crente, que foi vivificado e está vivo para Deus, que cresça, é apenas chamá-lo para um dever claro e bíblico. Ele tem um novo princípio dentro dele, e é um dever solene não sufocá-lo. Negligenciar o crescimento o priva de privilégios, entristece o Espírito e torna as rodas da carruagem de sua alma pesadas. De quem é a culpa, gostaria de saber, se um crente não cresce na graça? Tenho certeza de que a culpa não pode ser atribuída a Deus. Ele se deleita em "dar mais graça"; Ele "tem prazer na prosperidade dos seus servos". (Tiago iv. 6; Salmo xxxv. 27.) Sem dúvida, a culpa é nossa. Nós mesmos somos os culpados, e ninguém mais, se não crescemos.
II. O segundo ponto que proponho estabelecer é este: Existem marcas pelas quais o crescimento na graça pode ser conhecido.
Permitam-me tomar como certo que não questionamos a realidade do crescimento na graça e sua imensa importância. — Até aqui, tudo bem. Mas agora vocês querem saber como qualquer um pode descobrir se está crescendo na graça ou não? Respondo a essa pergunta, em primeiro lugar, observando que somos muito maus juízes de nossa própria condição, e que os observadores muitas vezes nos conhecem melhor do que nós mesmos. Mas respondo também que há, sem dúvida, certos grandes sinais e marcas de crescimento na graça, e que, onde quer que se vejam essas marcas, vê-se uma alma "em crescimento". Agora vou proceder a apresentar algumas dessas marcas em ordem.
(a) Uma marca do “crescimento na graça” é o aumento da humildade. O homem cuja alma está “crescendo” sente sua própria pecaminosidade e indignidade mais a cada ano. Ele está pronto para dizer com Jó: “sou vil”, — e com Abraão: “sou pó e cinza”, — e com Jacó: “não sou digno de todas as Tuas misericórdias”, — e com Davi: “sou um verme”, — e com Isaías: “sou um homem de lábios impuros”, — e com Pedro: “sou um homem pecador, ó Senhor.” (Jó 40:4; Gênesis 18:27; 32:10; Salmos 22:6; Isaías 6:5; Lucas 5:8.) Quanto mais ele se aproxima de Deus e mais vê da santidade e perfeição de Deus, mais plenamente sente suas próprias incontáveis imperfeições. Quanto mais avança no caminho para o céu, mais entende o que São Paulo quer dizer ao dizer: “não que já tenha alcançado a perfeição”, — “não sou digno de ser chamado apóstolo”, — “sou o menor de todos os santos”, — “sou o principal dos pecadores.” (Filipenses 3:12; 1 Coríntios 15:9; Efésios 3:8; 1 Timóteo 1:15.) Quanto mais maduro para a glória, mais, como o milho maduro, ele inclina sua cabeça. Quanto mais brilhante e claro é o seu entendimento, mais ele vê as falhas e enfermidades de seu próprio coração. Quando foi convertido pela primeira vez, ele diria que via muito pouco delas em comparação com o que vê agora. Alguém quer saber se está crescendo na graça? Certifique-se de olhar para dentro de si mesmo em busca de um aumento da humildade [4].
(b) Outra marca do “crescimento na graça” é o aumento da fé e do amor por nosso Senhor Jesus Cristo. O homem cuja alma está “crescendo” encontra mais em Cristo para se apoiar a cada ano, e se alegra mais por ter tal Salvador. Sem dúvida ele viu muito em Cristo quando primeiro creu. Sua fé se apegou à expiação de Cristo e lhe deu esperança. — Mas à medida que cresce na graça, ele vê mil coisas em Cristo das quais no início nunca havia sonhado. Seu amor e poder — Seu coração e Suas intenções — Seus ofícios como Substituto, Intercessor, Sacerdote, Advogado, Médico, Pastor e Amigo, se revelam a uma alma em crescimento de maneira indizível. Em resumo, ele descobre em Cristo uma adequação às necessidades de sua alma, da qual antes conhecia apenas uma pequena parte. Alguém quer saber se está crescendo na graça? Então, que olhe para dentro de si mesmo em busca de um aumento no conhecimento de Cristo.
(c) Outra marca do “crescimento na graça” é o aumento da santidade de vida e de conversação. O homem cuja alma está “crescendo” conquista mais domínio sobre o pecado, o mundo e o diabo a cada ano. Ele se torna mais cuidadoso com seu temperamento, suas palavras e suas ações. Ele vigia mais atentamente sua conduta em cada relação da vida. Esforça-se mais para se conformar à imagem de Cristo em todas as coisas e para segui-Lo como exemplo, assim como confiar n'Ele como Salvador. Não se contenta com antigas conquistas e graça passada. Esquece-se das coisas que ficaram para trás e avança para as que estão adiante, fazendo de “Mais alto!” “Para cima!” “Avante!” “Sempre em frente!” seu lema contínuo. (Filipenses 3:13.) Na terra, ele tem sede e anseia por ter uma vontade mais plenamente em harmonia com a vontade de Deus. No céu, a principal coisa que ele aguarda, depois da presença de Cristo, é a completa separação de todo pecado. Alguém quer saber se está crescendo na graça? Então, que olhe para dentro de si mesmo em busca de um aumento de santidade [5].
(d) Outra marca do “crescimento na graça” é o aumento da espiritualidade de gosto e de mente. O homem cuja alma está “crescendo” se interessa mais por coisas espirituais a cada ano. Ele não negligencia seus deveres no mundo. Cumpre fielmente, diligentemente e conscienciosamente cada relação da vida, seja em casa ou fora dela. Mas as coisas que ele mais ama são as coisas espirituais. As modas, os costumes, os passatempos e as recreações do mundo ocupam um lugar cada vez menor em seu coração. Ele não os condena como “abertamente pecaminosos”, nem afirma que aqueles que se envolvem com eles estão “indo para o inferno”. Ele apenas sente que eles têm uma influência cada vez menor sobre seus afetos e gradualmente parecem menores e mais triviais aos seus olhos. Companhias espirituais, ocupações espirituais e conversações espirituais lhe parecem de valor cada vez maior. Alguém quer saber se está crescendo na graça? Então, que olhe para dentro de si mesmo em busca de um aumento da espiritualidade de gosto [6].
(e) Outra marca do “crescimento na graça” é o aumento da caridade. O homem cuja alma está “crescendo” está mais cheio de amor a cada ano — amor por todos os homens, mas especialmente amor pelos irmãos. Seu amor se manifestará ativamente numa disposição crescente para fazer o bem, para se sacrificar pelos outros, para ser amável com todos, generoso, compassivo, atencioso, sensível e considerado. Manifestar-se-á passivamente numa disposição crescente para ser manso e paciente com todos os homens, para suportar provocações e não insistir em seus direitos, para suportar e tolerar muito mais do que para contender. Uma alma em crescimento tentará interpretar da melhor maneira possível a conduta dos outros, e crer em tudo e esperar tudo, até o fim. Não há marca mais segura de retrocesso e declínio na graça do que uma disposição crescente para criticar, encontrar falhas e ver os pontos fracos nos outros. Alguém quer saber se está crescendo na graça? Então, que olhe para dentro de si mesmo em busca de um aumento da caridade.
(f) Mais uma marca do "crescimento na graça" é o aumento do zelo e da diligência em tentar fazer o bem às almas. O homem que está realmente "crescendo" terá cada ano mais interesse na salvação dos pecadores. Missões em casa e no exterior, esforços para aumentar a luz religiosa e diminuir a escuridão religiosa — todas essas coisas terão, a cada ano, um lugar maior em sua atenção. Ele não se tornará "cansado de fazer o bem" porque não vê sucesso em cada esforço. Não se importará menos com o progresso da causa de Cristo na terra à medida que envelhece, embora aprenda a esperar menos. Ele simplesmente continuará trabalhando, seja qual for o resultado — doando, orando, pregando, falando, visitando, conforme sua posição — e considerará seu trabalho sua própria recompensa. Uma das marcas mais seguras de declínio espiritual é o interesse decrescente pelas almas dos outros e pelo crescimento do reino de Cristo. Alguém gostaria de saber se está crescendo na graça? Então que olhe para dentro de si e veja se há um aumento na preocupação com a salvação das almas.
Tais são os sinais mais confiáveis do crescimento na graça. Examinemo-los com cuidado e consideremos o que sabemos sobre eles. Posso muito bem acreditar que eles não agradarão a alguns cristãos professos da atualidade. Aqueles religiosos exaltados, cuja única noção de cristianismo é a de um estado de perpétua alegria e êxtase — que dizem ter avançado muito além da região de conflito e humilhação da alma — tais pessoas, sem dúvida, considerarão as marcas que apresentei como "legais", "carnais" e "geradoras de escravidão". Não posso fazer nada quanto a isso. Não chamo nenhum homem de mestre nessas coisas. Desejo apenas que minhas declarações sejam examinadas na balança das Escrituras. E creio firmemente que o que disse não é apenas bíblico, mas também está de acordo com a experiência dos santos mais eminentes em todas as eras. Mostre-me um homem em quem se encontrem as seis marcas que mencionei. Ele é o homem que pode dar uma resposta satisfatória à pergunta: ESTAMOS CRESCENDO?
III. A terceira e última coisa que proponho considerar é esta:—Os meios que devem ser usados por aqueles que desejam crescer na graça. As palavras de São Tiago nunca devem ser esquecidas: "Toda boa dádiva e todo dom perfeito vem do alto e desce do Pai das luzes." (Tiago i. 17.) Sem dúvida, isso é tão verdadeiro em relação ao crescimento na graça quanto a qualquer outra coisa. É o "dom de Deus." Mas ainda assim, deve-se sempre ter em mente que Deus se agrada de operar por meio de instrumentos. Deus ordenou meios, assim como fins. Aquele que deseja crescer na graça deve usar os meios de crescimento [7].
Este é um ponto que, temo, é muito negligenciado pelos crentes. Muitos admiram o crescimento na graça em outros e gostariam que fossem como eles. Mas parecem supor que aqueles que crescem são o que são por algum dom especial ou concessão de Deus, e que, como esse dom não foi concedido a si mesmos, devem contentar-se em permanecer como estão. Esta é uma ilusão grave, contra a qual desejo testemunhar com todas as minhas forças. Quero que fique claramente entendido que o crescimento na graça está ligado ao uso de meios ao alcance de todos os crentes, e que, como regra geral, as almas que crescem são o que são porque usam esses meios.
Peço a especial atenção dos meus leitores enquanto tento expor em ordem os meios de crescimento. Lançai fora para sempre o pensamento vão de que, se um crente não cresce na graça, não é culpa sua. Estabelecei firmemente em vossas mentes que um crente, um homem vivificado pelo Espírito, não é uma mera criatura morta, mas um ser de grandes capacidades e responsabilidades. Que as palavras de Salomão penetrem profundamente em vosso coração: "A alma do diligente engordará." (Provérbios 13. 4.)
(a) Uma coisa essencial para o crescimento na graça é a diligência no uso dos meios privados de graça. Por esses entendo os meios que um homem deve usar sozinho, e que ninguém pode usar por ele. Incluo sob esse título a oração privada, a leitura privada das Escrituras e a meditação e autoexame privados. O homem que não se empenha nessas três coisas nunca deve esperar crescer. Aqui estão as raízes do verdadeiro cristianismo. Errando aqui, o homem errará em todo o caminho! Aqui está toda a razão pela qual muitos cristãos professos nunca parecem progredir. São descuidados e negligentes com suas orações privadas. Leem pouco a Bíblia, e com muito pouca sinceridade de espírito. Não se dão tempo para examinar a si mesmos e refletir em silêncio sobre o estado de suas almas.
É inútil esconder de nós mesmos que a época em que vivemos está cheia de perigos peculiares. É uma era de grande atividade e de muita pressa, agitação e excitação na religião. Muitos estão "correndo de um lado para o outro", sem dúvida, e "o conhecimento se multiplica." (Dan. xii. 4.) Milhares estão prontos para reuniões públicas, ouvir sermões ou qualquer outra coisa que envolva "sensação." Poucos parecem lembrar da necessidade absoluta de reservar tempo para "comungar com o próprio coração e ficar em silêncio." (Salmo iv. 4.) Mas sem isso raramente há verdadeira prosperidade espiritual. Suspeito que os cristãos ingleses de duzentos anos atrás liam mais suas Bíblias e estavam mais frequentemente a sós com Deus do que hoje em dia. Lembremo-nos deste ponto! A religião privada deve receber nossa primeira atenção, se quisermos que nossas almas cresçam.
(b) Outra coisa essencial para o crescimento na graça é o cuidado no uso dos meios públicos de graça. Por estes, entendo os meios que um homem tem ao seu alcance como membro da Igreja visível de Cristo. Sob este título, incluo as ordenanças do culto regular aos domingos, a união com o povo de Deus em oração e louvor comuns, a pregação da Palavra e o Sacramento da Ceia do Senhor. Creio firmemente que a maneira como esses meios públicos de graça são usados tem muito a ver com a prosperidade da alma de um crente. É fácil usá-los de maneira fria e sem coração. A própria familiaridade com eles tende a nos tornar descuidados. O retorno regular da mesma voz, do mesmo tipo de palavras e das mesmas cerimônias, tende a nos tornar sonolentos, insensíveis e indiferentes. Aqui está uma armadilha na qual muitos cristãos professos caem. Se quisermos crescer, devemos estar atentos aqui. Este é um assunto no qual o Espírito muitas vezes se entristece e os santos sofrem grande dano. Esforcemo-nos para usar as velhas orações, cantar os velhos hinos, ajoelhar-nos no velho altar de comunhão e ouvir as velhas verdades pregadas com tanta frescura e apetite como no ano em que primeiro cremos. É sinal de má saúde quando uma pessoa perde o apetite pela comida; e é sinal de declínio espiritual quando perdemos o apetite pelos meios de graça. Seja o que for que façamos quanto aos meios públicos, façamo-lo sempre "com todo o nosso poder." (Eclesiastes ix. 10.) Este é o caminho para crescer!
(c) Outra coisa essencial para o crescimento na graça é a vigilância sobre nossa conduta nas pequenas coisas da vida cotidiana. Nossos temperamentos, nossas palavras, o cumprimento de nossos vários papéis na vida, o uso do nosso tempo — tudo isso deve ser atentamente observado se quisermos que nossas almas prosperem. A vida é feita de dias, e os dias de horas, e as pequenas coisas de cada hora nunca são tão pequenas a ponto de estarem abaixo do cuidado de um cristão. Quando uma árvore começa a apodrecer na raiz ou no cerne, o estrago primeiro se manifesta nas extremidades dos pequenos galhos. "Aquele que despreza as coisas pequenas," diz um escritor não inspirado, "cairá pouco a pouco." Esse testemunho é verdadeiro. Que outros nos desprezem, se quiserem, e nos chamem de precisos e excessivamente cuidadosos. Sigamos pacientemente em nosso caminho, lembrando que "servimos a um Deus preciso," que o exemplo do nosso Senhor deve ser copiado nas menores coisas tanto quanto nas maiores, e que devemos "tomar nossa cruz diariamente" e a cada hora, antes de pecar. Devemos almejar ter um cristianismo que, como a seiva de uma árvore, corra por cada ramo e folha do nosso caráter, santificando tudo. Este é um caminho para crescer!
(d) Outra coisa essencial para o crescimento na graça é a cautela quanto à companhia que mantemos e às amizades que formamos. Nada, talvez, afete mais o caráter de um homem do que a companhia que ele mantém. Pegamos os modos e o tom daqueles com quem convivemos e conversamos, e, infelizmente, absorvemos mais facilmente o mal do que o bem. A doença é contagiosa, mas a saúde não é. Ora, se um cristão professo escolhe deliberadamente ser íntimo daqueles que não são amigos de Deus e que se apegam ao mundo, sua alma certamente sofrerá dano. Já é difícil servir a Cristo sob quaisquer circunstâncias neste mundo; mas é duplamente difícil fazê-lo se somos amigos dos descuidados e ímpios. Erros em amizades ou em compromissos de casamento são toda a razão pela qual alguns cessaram completamente de crescer. "As más companhias corrompem os bons costumes." "A amizade do mundo é inimizade contra Deus." (1 Coríntios xv. 33; Tiago iv. 4.) Busquemos amigos que nos estimulem quanto às nossas "orações," à nossa "leitura da Bíblia" e ao nosso "uso do tempo" — quanto às nossas almas, à nossa salvação e ao "mundo por vir." Quem pode medir o bem que a palavra de um amigo a tempo pode fazer, ou o mal que pode impedir? Este é um caminho para crescer [8].
(e) Há mais uma coisa que é absolutamente essencial para o crescimento na graça — e isso é a comunhão regular e habitual com o Senhor Jesus. Ao dizer isso, que ninguém suponha por um minuto que estou me referindo à Ceia do Senhor. Não quero dizer nada disso. Refiro-me ao hábito diário de relacionamento entre o crente e seu Salvador, que só pode ser mantido pela fé, oração e meditação. É um hábito que, temo, muitos crentes conhecem pouco. Um homem pode ser crente e ter seus pés sobre a rocha, e ainda assim viver muito aquém dos seus privilégios. É possível ter "união" com Cristo e, no entanto, ter pouca ou nenhuma "comunhão" com Ele. Mas, apesar disso, tal coisa existe.
Os nomes e os ofícios de Cristo, conforme expostos nas Escrituras, parecem-me mostrar de maneira inconfundível que essa "comunhão" entre o santo e seu Salvador não é uma mera fantasia, mas algo real e verdadeiro. Entre o "Noivo" e sua noiva — entre a "Cabeça" e seus membros — entre o "Médico" e seus pacientes — entre o "Advogado" e seus clientes — entre o "Pastor" e suas ovelhas — entre o "Mestre" e seus discípulos — há evidentemente a implicação de um hábito de relacionamento íntimo, de aplicação diária para as coisas necessárias, de derramamento e desabafo diário dos nossos corações e mentes. Tal hábito de relacionamento com Cristo é claramente algo mais do que uma confiança geral e vaga na obra que Cristo realizou pelos pecadores. Trata-se de aproximar-se d'Ele e agarrar-se a Ele com confiança, como a um Amigo pessoal e amoroso. Isso é o que quero dizer por comunhão.
Agora, acredito que nenhum homem jamais crescerá na graça se não souber, de forma experimental, algo do hábito da "comunhão". Não devemos nos contentar com um conhecimento ortodoxo geral de que a justificação é pela fé e não pelas obras, e que depositamos nossa confiança em Cristo. Devemos ir além disso. Devemos buscar ter intimidade pessoal com o Senhor Jesus e lidar com Ele como se lida com um amigo amoroso. Devemos compreender o que é recorrer a Ele primeiro em toda necessidade, falar com Ele sobre toda dificuldade, consultá-Lo sobre cada passo, expor-Lhe todas as nossas mágoas, fazê-Lo participar de todas as nossas alegrias, fazer tudo como diante d'Ele e passar cada dia apoiando-nos n'Ele e olhando para Ele. Foi assim que São Paulo viveu: "A vida que agora vivo na carne, vivo-a pela fé no Filho de Deus." "Para mim, o viver é Cristo." (Gál. ii. 20; Fil. i. 21.) É a ignorância deste modo de viver que faz com que tantos não vejam beleza alguma no livro de Cantares. Mas é o homem que vive deste modo, que mantém comunhão constante com Cristo — este é o homem, digo com ênfase, cuja alma crescerá.
Deixo aqui o tema do crescimento na graça. Muito mais poderia ser dito sobre isso, se o tempo permitisse. Mas disse o suficiente, espero, para convencer meus leitores de que o assunto é de suma importância. — Deixe-me concluir tudo com algumas aplicações práticas.
(1) Este livro pode cair nas mãos de alguns que nada sabem sobre crescimento na graça. Têm pouca ou nenhuma preocupação com a religião. Um pouco de idas adequadas à igreja ou capela aos domingos compõem toda a substância do seu Cristianismo. Estão sem vida espiritual e, naturalmente, não podem, no momento, crescer. Você é uma dessas pessoas? Se for, está em uma condição lamentável.
Os anos estão escapando e o tempo está voando. Os cemitérios estão se enchendo e as famílias estão diminuindo. A morte e o juízo estão se aproximando de todos nós. E, no entanto, você vive como alguém adormecido em relação à sua alma! Que loucura! Que insensatez! Que suicídio poderia ser pior do que este?
Desperte antes que seja tarde demais; desperte e levante-se dentre os mortos, e viva para Deus. Volte-se para Aquele que está sentado à direita de Deus, para ser seu Salvador e Amigo. Volte-se para Cristo e clame poderosamente a Ele pela sua alma. Ainda há esperança! Aquele que chamou Lázaro do túmulo não mudou. Aquele que ordenou ao filho da viúva de Naim que se levantasse de sua padiola ainda pode fazer milagres pela sua alma. Busque-O imediatamente: busque a Cristo, se você não quiser estar perdido para sempre. Não fique parado apenas falando, pretendendo, planejando, desejando e esperando. Busque a Cristo para que você viva, e vivendo, possa crescer.
(2) Este livro pode cair nas mãos de alguns que deveriam saber algo sobre crescimento na graça, mas que atualmente nada sabem. Eles fizeram pouco ou nenhum progresso desde que se converteram. Parecem ter "se acomodado sobre as suas borras" ("Zc 1:12"). Prosseguem de ano em ano satisfeitos com graça antiga, experiência antiga, conhecimento antigo, fé antiga, medida antiga de progresso, expressões religiosas antigas, frases feitas antigas. Como os gibeonitas, seu pão está sempre bolorento, e seus sapatos estão remendados e esfarrapados. Eles nunca parecem avançar. Você é uma dessas pessoas? Se for, está vivendo muito aquém dos seus privilégios e responsabilidades. Já é mais do que tempo de examinar-se.
Se você tem razões para esperar que seja um verdadeiro crente e ainda assim não cresce na graça, deve haver uma falha, e uma falha séria, em algum lugar. Não pode ser a vontade de Deus que sua alma permaneça parada. "Ele dá maior graça." Ele "tem prazer na prosperidade dos Seus servos" ("Tg 4:6"; "Sl 35:27"). Não pode ser para sua felicidade ou utilidade que sua alma permaneça parada. Sem crescimento, você nunca se regozijará no Senhor ("Fp 4:4"). Sem crescimento, você nunca fará o bem a outros. Certamente, essa falta de crescimento é um assunto sério! Isso deve provocar em você grandes sondagens de coração. Deve haver alguma "coisa oculta" ("Jó 15:11"). Deve haver alguma causa.
Aceite o conselho que lhe dou. Resolva neste mesmo dia encontrar a razão de sua condição estagnada. Sondar com mão fiel e firme cada canto da sua alma. Vasculhe de um extremo a outro do acampamento até encontrar o Acã que está enfraquecendo suas mãos. Comece aplicando-se ao Senhor Jesus Cristo, o grande Médico das almas, e peça a Ele que cure o mal secreto dentro de você, seja ele qual for. Comece como se nunca tivesse se aplicado a Ele antes, e peça graça para cortar a mão direita e arrancar o olho direito. Mas nunca, nunca fique contente se sua alma não crescer. Por causa da sua paz, da sua utilidade e para a honra da causa do seu Criador, resolva descobrir a razão.
(3) Este livro pode cair nas mãos de alguns que realmente estão crescendo na graça, mas não têm consciência disso e não admitem tal coisa. O próprio crescimento deles é a razão pela qual não percebem o seu crescimento! O seu contínuo aumento em humildade impede que sintam que estão avançando [9]. Como Moisés, quando desceu do monte após ter comunhão com Deus, seus rostos brilham. E, ainda assim, como Moisés, eles não estão cientes disso ("Êx 34:29"). Admito livremente que tais cristãos não são comuns. Mas aqui e ali podem ser encontrados. Como visitas de anjos, são raros e espaçados. Feliz é o bairro onde tais cristãos crescentes vivem! Encontrá-los, vê-los e estar em sua companhia é como encontrar e ver um pouco do "céu na terra".
Agora, o que devo dizer a essas pessoas? O que posso dizer? O que devo dizer? Devo dizer-lhes para despertarem para a consciência de seu crescimento e se agradarem disso? Não farei nada disso. Devo dizer-lhes para se orgulharem de suas próprias conquistas e olharem para sua superioridade em relação aos outros? Deus me livre! Não farei nada disso. Dizer-lhes tais coisas não lhes faria bem algum. Acima de tudo, seria uma completa perda de tempo. Se há alguma característica especial em uma alma que cresce, é seu profundo senso da própria indignidade. Ela nunca vê nada para ser louvado em si mesma. Só sente que é um servo inútil e o principal dos pecadores. É o justo, na imagem do dia do juízo, quem diz: "Senhor, quando te vimos com fome, e te alimentamos?" ("Mt 25:37"). De fato, os extremos se encontram de maneira estranha às vezes. O pecador de consciência endurecida e o santo eminente são, em certo aspecto, singularmente parecidos. Nenhum deles realiza plenamente sua própria condição. Um não vê seu próprio pecado, o outro não vê sua própria graça!
Mas devo dizer nada aos cristãos que crescem? Não há palavra de conselho que eu possa lhes dirigir? A soma e o resumo de tudo que posso dizer encontram-se em duas sentenças: "Avance!" "Prossiga!"
Nunca poderemos ter humildade demais, fé demais em Cristo, santidade demais, espiritualidade de mente demais, caridade demais, zelo demais em fazer o bem aos outros. Então, deixemos de lado continuamente as coisas que ficaram para trás e avancemos para as que estão adiante. (Filipenses iii. 13.) O melhor dos cristãos nestes aspectos está infinitamente abaixo do padrão perfeito de seu Senhor. Seja o que for que o mundo diga, podemos ter certeza de que não há perigo de qualquer um de nós se tornar "bom demais".
Lancemos ao vento, como conversa vã, a noção comum de que é possível ser "extremo" e ir "longe demais" na religião. Esta é uma mentira favorita do diabo, e uma que ele espalha com vasta indústria. Sem dúvida, há entusiastas e fanáticos que trazem má fama ao cristianismo com seus exageros e loucuras. Mas se alguém pretende dizer que um homem mortal pode ser humilde demais, caridoso demais, santo demais ou diligente demais em fazer o bem, deve ser ou um infiel ou um tolo. Em servir o prazer e o dinheiro é fácil ir longe demais. Mas ao seguir as coisas que constituem a verdadeira religião, e ao servir a Cristo, não pode haver excesso.
Nunca devemos medir nossa religião pela dos outros e pensar que estamos fazendo o suficiente se tivermos ido além dos nossos vizinhos. Este é outro laço do diabo. Cuidemos dos nossos próprios assuntos. "Que te importa a ti?" disse nosso Mestre em certa ocasião: "Segue-me tu." (João xxi. 22.) Sigamos em frente, mirando nada menos do que a perfeição. Sigamos em frente, fazendo da vida e do caráter de Cristo nosso único modelo e exemplo. Sigamos em frente, lembrando diariamente que, em nosso melhor, somos pecadores miseráveis. Sigamos em frente e nunca esqueçamos que não importa se somos melhores do que os outros ou não. No nosso melhor estado, somos muito piores do que deveríamos ser. Sempre haverá espaço para melhoria em nós. Seremos devedores da misericórdia e graça de Cristo até o fim. Então, deixemos de olhar para os outros e de nos comparar com os outros. Encontraremos o suficiente para fazer se olharmos para nossos próprios corações.
Por fim, mas não menos importante, se sabemos algo sobre crescimento na graça, e desejamos saber mais, não nos surpreendamos se tivermos que passar por muitas provações e aflições neste mundo. Creio firmemente que esta é a experiência de quase todos os santos mais eminentes. Como seu bendito Mestre, eles foram "homens de dores, experimentados no sofrimento", e "aperfeiçoados pelas aflições." (Isaías liii. 3; Hebreus ii. 10.) É uma afirmação marcante de nosso Senhor: "Todo ramo que, estando em mim, não dá fruto, ele o limpa, para que produza mais fruto." (João xv. 2.) É um fato melancólico que a prosperidade temporal constante, como regra geral, é prejudicial à alma de um crente. Não conseguimos suportá-la. Doenças, perdas, cruzes, ansiedades e decepções parecem absolutamente necessárias para nos manter humildes, vigilantes e espiritualmente atentos. São tão necessárias quanto a faca de poda para a videira e o forno do refinador para o ouro. Não são agradáveis à carne e ao sangue. Não gostamos delas, e muitas vezes não entendemos seu significado. "Nenhuma disciplina parece ser motivo de alegria no momento, mas de tristeza; depois, entretanto, produz um fruto pacífico de justiça." (Hebreus xii. 11.) Descobriremos que tudo cooperou para o nosso bem quando chegarmos ao céu. Que esses pensamentos permaneçam em nossas mentes, se amamos o crescimento na graça. Quando dias de escuridão vierem sobre nós, não consideremos isso algo estranho. Antes, lembremo-nos de que lições são aprendidas nesses dias que nunca seriam aprendidas sob o sol. Digamos a nós mesmos: "Isto também é para meu proveito, para que eu possa ser participante da santidade de Deus. Foi enviado em amor. Estou na melhor escola de Deus. A correção é instrução. Isto é para me fazer crescer."
Deixo aqui o tema do crescimento na graça. Espero ter dito o suficiente para fazer alguns leitores refletirem sobre isso. Todas as coisas estão envelhecendo: o mundo está envelhecendo; nós mesmos estamos envelhecendo. Mais alguns verões, mais alguns invernos, mais algumas doenças, mais algumas tristezas, mais alguns casamentos, mais alguns funerais, mais alguns encontros e mais algumas despedidas, e então — o quê? Bem, então a grama estará crescendo sobre nossos túmulos!
Agora, não seria bom olharmos para dentro de nós e fazermos a nossa alma uma pergunta simples? Na religião, nas coisas que concernem à nossa paz, na grande questão da santidade pessoal, estamos progredindo? ESTAMOS CRESCENDO?
~
J. C. Ryle
Holiness.
Notas:
[1] “A verdadeira graça é progressiva, de natureza expansiva e crescente. Com a graça acontece como com a luz: primeiro, vem o romper do dia; depois ela brilha cada vez mais até o meio-dia completo. Os santos não são apenas comparados a estrelas por sua luz, mas a árvores pelo seu crescimento (Isaías 61:3; Oséias 14:5). Um bom cristão não é como o sol de Ezequias, que retrocedeu, nem como o sol de Josué, que permaneceu parado, mas está sempre avançando em santidade e crescendo com o crescimento que vem de Deus.”—Thomas Watson, Ministro da St. Stephen’s Walbrook, 1660. (Body of Divinity.)
[2] “O crescimento da graça é a melhor evidência da veracidade da graça. Coisas que não têm vida não crescem. Um quadro não cresce. Uma estaca numa cerca não cresce. Mas uma planta que tem vida vegetativa crescerá. O crescimento da graça mostra que ela está viva na alma.”—T. Watson, 1660.
[3] “Cristão, se você deseja realmente incitar outros a exaltar o Deus da graça, atente para o exercício e o aprimoramento de suas próprias graças. Quando servos pobres vivem numa família e veem a fé, o amor, a sabedoria, a paciência e a humildade de um senhor brilhando como estrelas no céu, isso leva seus corações a bendizer o Senhor por terem entrado em tal família.—Quando as graças dos homens brilham como o rosto de Moisés, quando sua vida, como alguém disse sobre a vida de José, é um verdadeiro céu, cintilando com virtudes como tantas estrelas brilhantes, quanto mais os outros são levados a glorificar a Deus e a clamar: ‘Estes são verdadeiros cristãos! Estes são uma honra para seu Deus, uma coroa para seu Cristo e um crédito para seu Evangelho! Oh, se todos fossem assim, também nós seríamos cristãos!’”—T. Brooks, 1661. (Unsearchable Riches.)
[4] “A maneira correta de crescer é crescer menos aos próprios olhos. ‘Eu sou um verme e não um homem.’ (Salmos 22:6.) A visão da corrupção e da ignorância faz o cristão crescer em aversão a si mesmo. Ele desaparece aos seus próprios olhos. Jó abominou-se no pó. (Jó 42:6.) Isto é bom: deixar de ter boa opinião de si mesmo.”—T. Watson, 1660.
[5] “É um sinal de que não estamos crescendo em graça quando ficamos menos perturbados com o pecado. Houve um tempo em que o menor pecado nos entristecia (como o menor fio de cabelo faz o olho lacrimejar), mas agora podemos digerir o pecado sem remorso. Houve um tempo em que o cristão se incomodava se negligenciasse a oração privada; agora pode omitir a oração em família. Houve um tempo em que pensamentos vãos o incomodavam; agora não se incomoda com práticas levianas. Há uma triste decadência na religião; e a graça está tão longe de crescer que mal podemos perceber seu pulso bater.”—T. Watson, 1660.
[6] “Se agora você deseja ser rico em graças, atente para sua conduta. Não é a alma que sabe, nem a alma que fala, mas a alma que anda de perto, a alma obediente, que é rica. Outros podem ser ricos em noções, mas ninguém é tão rico em experiência espiritual e em todas as graças santas e celestiais quanto os cristãos que andam de perto com Deus.”—T. Brooks, 1661.
“É um sinal de que não estamos crescendo em graça quando nos tornamos mais mundanos. Talvez já estivéssemos elevados a órbitas mais altas, com nossos corações postos nas coisas do alto, falando a linguagem de Canaã. Mas agora nossas mentes se afastam do céu, cavamos nossos confortos nas minas inferiores e, com Satanás, percorremos a terra. É um sinal de que estamos descendo rapidamente, e nossa graça está em estado de consumo. É notável que, quando a natureza decai e as pessoas estão próximas da morte, elas se tornam mais curvadas. E verdadeiramente, quando os corações dos homens se inclinam mais para a terra e mal conseguem levantar-se para um pensamento celestial, se a graça não está morta, está prestes a morrer.”—T. Watson, 1660.
[7] “A experiência dirá a todo cristão que quanto mais estritamente, mais de perto e mais constantemente ele anda com Deus, mais forte ele se torna no dever. Os hábitos infundidos são fortalecidos pelo exercício. Assim como o fogo que acendeu a madeira para os sacrifícios no altar veio primeiro do céu, mas depois deveria ser mantido vivo pelo cuidado e trabalho dos sacerdotes, assim também os hábitos da graça espiritual são de fato infundidos por Deus e devem ser mantidos por influências diárias de Deus, mas também com a colaboração de nossos próprios esforços, esperando em Deus e exercitando-nos na piedade; e quanto mais um cristão se exercita assim, mais forte ele se tornará.”—Collinges sobre a Providência. 1678.
[8] “Que sejam teus companheiros mais íntimos aqueles que fizeram de Cristo seu companheiro principal. Não atentes tanto para o exterior dos homens, mas para seu interior: observe mais o valor interno. Muitas pessoas têm seus olhos voltados para o traje exterior de um professor. Mas prefiro um cristão que atenta para o valor interno das pessoas, que escolhe como companheiros mais íntimos aqueles que estão mais cheios da plenitude de Deus.”—T. Brooks, 1661.
[9] “Cristãos podem estar crescendo mesmo quando pensam que não estão crescendo.” ‘Há quem se faça pobre e, contudo, é rico.’ (Provérbios 13:7.) A visão que os cristãos têm de suas deficiências na graça e a sede por maiores medidas de graça faz com que pensem que não estão crescendo. Aquele que cobiça uma grande fortuna, porque não tem tanto quanto deseja, pensa ser pobre.”—T. Watson, 1660.
“As almas podem ser ricas em graça e ainda assim não saberem, não perceberem. A criança é herdeira de uma coroa ou de uma grande herança, mas não sabe disso. O rosto de Moisés brilhava, e outros viam, mas ele não percebia. Assim, muitas almas preciosas são ricas em graça, e outros veem, sabem e bendizem a Deus por isso, mas a pobre alma não percebe.—Às vezes isso ocorre devido aos fortes desejos da alma por riquezas espirituais. A força do desejo da alma por riquezas espirituais muitas vezes tira a própria percepção de seu crescimento espiritual. Muitos homens cobiçosos têm desejos tão fortemente direcionados às riquezas terrenas que, embora estejam se enriquecendo, não conseguem perceber nem acreditar nisso. Assim acontece com muitos cristãos preciosos: seus desejos por riquezas espirituais são tão fortes que lhes tiram a percepção de que estão crescendo espiritualmente ricos. Muitos cristãos têm grande valor dentro de si, mas não o veem. Foi um bom homem quem disse: ‘O Senhor estava neste lugar e eu não sabia.’—Além disso, isso às vezes ocorre porque os homens negligenciam fazer um balanço de suas contas. Muitos prosperam e enriquecem, mas, por negligenciarem avaliar seus ganhos, não sabem se estão progredindo ou retrocedendo. Assim acontece com muitas almas preciosas. Além disso, às vezes isso ocorre porque a alma avalia suas contas com muita frequência. Se um homem fizer um balanço de suas contas uma vez por semana ou por mês, pode não ser capaz de perceber seu enriquecimento, embora esteja enriquecendo. Mas se comparar um ano com outro, verá claramente que está enriquecendo.—Além disso, às vezes isso decorre de erros da alma ao fazer seu balanço. Muitas vezes a alma se engana: está apressada e então registra dez por cem, e cem por mil. Assim como os hipócritas registram seus contadores como ouro, seus centavos como libras, sempre se avaliando acima do mercado, assim também as almas sinceras muitas vezes registram suas libras como centavos, seus milhares como centenas, sempre se subestimando em relação ao mercado.”—Thomas Brooks, 1661. (Unsearchable Riches)