George MacDonald (1824-1905). Nascido em 10 de dezembro de 1824, em Huntly, Aberdeenshire, na Escócia, George MacDonald emergiu como uma figura singular no panorama literário e espiritual do século XIX. Autor, poeta e ministro cristão congregacional, ele foi um pioneiro da literatura de fantasia moderna, deixando um legado que transcendeu gêneros e inspirou gerações de escritores, entre eles Lewis Carroll, a quem orientou. Além de suas narrativas fantásticas, MacDonald dedicou-se à teologia cristã, produzindo coleções de sermões que revelam sua visão profunda e inovadora da fé.
A infância de MacDonald foi moldada por um ambiente de excepcional riqueza intelectual. Filho de George MacDonald, um fabricante, e Helen McCay, ele cresceu em uma família conectada às tradições do clã MacDonald de Glen Coe, marcado pela tragédia do massacre de 1692. Seu tio materno, Mackintosh MacKay, era um eminente estudioso celta, responsável por compilar contos de fadas e poesia oral gaélica, enquanto seu avô paterno apoiou a publicação de Ossian, de James Macpherson, um épico que impulsionou o romantismo europeu. A influência literária também vinha de seu pai, um leitor ávido de figuras como Isaac Newton, Robert Burns e Samuel Taylor Coleridge, e de sua mãe, que possuía uma educação clássica abrangente, incluindo o domínio de múltiplas línguas. Esse caldo cultural nutriu a sensibilidade de MacDonald desde cedo, embora sua saúde frágil, marcada por asma, bronquite e até um episódio de tuberculose, lançasse sombras sobre sua juventude. A tuberculose, uma doença que ceifou a vida de sua mãe, dois irmãos e, mais tarde, três de seus filhos, foi uma constante em sua vida, levando-o a buscar climas mais favoráveis para seus pulmões.
Criado na Igreja Congregacional, MacDonald foi exposto ao rigor do calvinismo, mas sua família desafiava convenções. Seu avô paterno, um presbítero presbiteriano que tocava violino, tinha raízes católicas; sua avó era uma rebelde de uma igreja independente; e sua madrasta, filha de um sacerdote episcopal escocês, trouxe uma perspectiva diversa. Essa pluralidade religiosa influenciou sua visão teológica, que rejeitava aspectos do calvinismo, como a predestinação, em favor de um entendimento mais universalista do amor divino. Após graduar-se em química e física pelo King’s College, em Aberdeen, em 1845, MacDonald enfrentou anos de introspecção, debatendo sua vocação. Embora pudesse ter seguido a medicina, a falta de recursos o levou à formação teológica no Highbury College, em 1848, preparando-se para o ministério congregacional.
Em 1850, MacDonald assumiu o pastorado da Igreja Congregacional da Trindade, em Arundel, mas seus sermões, que enfatizavam o amor universal de Deus e a redenção acessível a todos, encontraram resistência. Com seu salário reduzido pela metade, ele renunciou em 1853. Após um breve período em Manchester, problemas de saúde o forçaram a abandonar o ministério. Em 1856, incentivado por Lady Byron, viajou a Argel em busca de recuperação, e, ao retornar, estabeleceu-se em Londres, onde lecionou na Universidade de Londres e editou a revista Good Words for the Young. Foi nesse período que sua carreira literária ganhou ímpeto, com a publicação de seu primeiro romance realista, David Elginbrod, em 1863, e obras de fantasia como Phantastes (1858), The Princess and the Goblin (1872) e Lilith (1895). MacDonald afirmava escrever para o “infantil” em todos, independentemente da idade, criando narrativas que mesclavam encantamento e reflexões profundas sobre a condição humana.
Considerado o pai da fantasia moderna, MacDonald influenciou escritores como C.S. Lewis, que o retratou em The Great Divorce e elogiou seus sermões em Unspoken Sermons como uma fonte de inspiração espiritual, e J.R.R. Tolkien. Sua relação com Lewis Carroll foi igualmente significativa: o entusiasmo de seus filhos por Alice convenceu Carroll a publicar sua obra-prima. Amigo de figuras como John Ruskin, Longfellow e Walt Whitman, MacDonald também realizou uma turnê de palestras nos Estados Unidos entre 1872 e 1873, falando sobre poetas como Shakespeare e Robert Burns para grandes audiências. Seus romances realistas, como Alec Forbes, marcaram o início da escola “kailyard” da literatura escocesa, caracterizada por retratos vívidos da vida rural.
A partir de 1879, MacDonald e sua família estabeleceram-se em Bordighera, na Riviera italiana, onde viveram por duas décadas. Lá, ele fundou a Casa Coraggio, um estúdio literário que se tornou um centro cultural frequentado por viajantes britânicos e italianos. Nesse refúgio, escreveu grande parte de sua obra fantástica e promoveu leituras de Dante e Shakespeare. Em 1900, mudou-se para St George’s Wood, em Haslemere, uma casa projetada por seu filho Robert. MacDonald faleceu em 18 de setembro de 1905, em Ashtead, Surrey, e suas cinzas foram sepultadas em Bordighera, ao lado de sua esposa, Louisa Powell, com quem teve onze filhos, e de suas filhas Lilia e Grace.
Casado com Louisa em 1851, MacDonald criou uma família numerosa, marcada tanto por amor quanto por perdas. A tuberculose tirou a vida de quatro de seus filhos, incluindo Lilia, sua primogênita, cuja morte o abalou profundamente. Seus filhos Greville, um médico e escritor de contos de fadas, e Ronald, um romancista, perpetuaram seu legado, enquanto seu neto Philip MacDonald tornou-se roteirista em Hollywood. A teologia de MacDonald, articulada em sermões como “Justice”, celebrava Deus como um pai amoroso, rejeitando a ideia de punição divina em favor de uma visão de redenção universal. Ele via o sacrifício de Cristo não como apaziguamento de uma ira divina, mas como vitória sobre o mal cósmico, uma perspectiva que ecoava a teoria do Christus Victor. Para MacDonald, o amor de Deus buscava sempre a restauração, mesmo que isso exigisse a purificação pelo “fogo” do arrependimento.
Sua obra e pensamento deixaram marcas indeléveis. G.K. Chesterton creditou The Princess and the Goblin por transformar sua percepção do mundo, enquanto C.S. Lewis reconheceu MacDonald como seu “mestre”. Com uma visão que entrelaçava terror e consolo, MacDonald permanece uma ponte entre o humano e o divino, convidando leitores a enxergar o eterno nas escadas e portas do cotidiano.