A Epístola a Tito, uma das três epístolas pastorais do Novo Testamento, juntamente com 1 e 2 Timóteo, é tradicionalmente atribuída a Paulo, o Apóstolo, e dirigida a Tito, um colaborador de confiança na organização da Igreja primitiva. Escrita em grego koiné, a epístola compreende três capítulos e 46 versículos, preservada em manuscritos como o Codex Vaticanus (325-350 d.C.), Codex Sinaiticus (330-360 d.C.) e Minuscule 699, que a intitula “προς τιτον” (“A Tito”). O texto delineia as responsabilidades dos presbíteros e bispos, enfatizando a ordem e a doutrina sã nas comunidades cristãs. Tito, não mencionado nos Atos dos Apóstolos, aparece em Gálatas 2:1-3 como companheiro de Paulo em Jerusalém e é descrito como um gentio convertido que desempenhou papéis cruciais em Corinto e Creta, onde foi deixado para estruturar a Igreja (Tito 1:5). Segundo Eusébio de Cesareia, Tito foi o primeiro bispo de Creta, com sua memória preservada em Cortyna e relíquias trasladadas para Veneza no século IX. A epístola reflete o contexto da Igreja primitiva, onde a liderança estruturada era essencial para a estabilidade doutrinária e moral.
A autoria paulina da epístola tem sido objeto de debate. Tradicionalmente, estudiosos situam sua composição por volta de 66-67 d.C., após a libertação de Paulo da prisão romana, com a carta escrita de Nicópolis, na Macedônia. Essa cronologia pressupõe uma viagem de Paulo à Ásia, passando por Creta, onde deixou Tito, antes de seguir para Éfeso e Macedônia. Alguns defendem que Paulo usou um amanuense, possivelmente Lucas, prática comum na antiguidade (Romanos 16:22). Contudo, desde o século XIX, estudiosos como os da Escola de Tübingen questionam a autoria paulina, considerando a epístola pseudepígrafa, datada entre 80 e 100 d.C., ou até o final do século II. Argumentos incluem o vocabulário distinto, a ênfase em estruturas eclesiásticas pós-paulinas e afinidades com 1 Timóteo, sugerindo um autor comum, às vezes chamado “o Pastor”. O gnóstico Basilides rejeitou a epístola, mas sua aceitação canônica prevaleceu. A citação do paradoxo de Epimênides (Tito 1:12), sobre os cretenses serem “sempre mentirosos”, reflete uma interação com a cultura local, usada para exortar à conduta reta.
A epístola estrutura-se em uma saudação inicial (Tito 1:1-4), instruções sobre a organização eclesiástica e combate a falsos mestres (Tito 1:5-16), diretrizes para diferentes grupos na Igreja (Tito 2:1-15) e exortações à vida cristã e obediência civil (Tito 3:1-11), encerrando com saudações e planos de viagem (Tito 3:12-15). Seu foco na “sã doutrina” (Tito 1:9) e na formação de líderes qualificados reflete a preocupação cristã com a ortodoxia e a ética, em um contexto de influências culturais e heresias incipientes. A mensagem de Tito enfatiza a graça salvífica de Cristo, que capacita os crentes para boas obras (Tito 2:11-14), alinhando-se à teologia paulina da justificação e transformação. A epístola, com sua concisão e clareza, permanece um documento essencial para compreender a liderança cristã primitiva e a aplicação prática da fé.