William Laud (1573-1645), nascido em 7 de outubro de 1573 em Reading, Berkshire, e executado em 10 de janeiro de 1645 em Londres, foi uma figura central na Igreja da Inglaterra, alcançando o posto de Arcebispo de Canterbury sob Carlos I a partir de 1633. Defensor ardente da governança episcopal e da uniformidade litúrgica, suas reformas, conhecidas como Laudianismo, priorizavam a cerimônia no culto e a hierarquia clerical, buscando alinhar a Igreja inglesa com sua herança pré-Reforma. Sua teologia, frequentemente associada ao Arminianismo, enfatizava o livre-arbítrio e a graça sacramental, em oposição ao predestinacionismo calvinista predominante entre os puritanos. A aplicação rigorosa das políticas religiosas reais, junto ao uso da Câmara Estrelada para perseguir opositores, tornou-o uma figura controversa, levando à sua prisão pelo Parlamento em 1640 e execução durante a Guerra Civil Inglesa. A vida de Laud reflete um compromisso profundo com uma visão da Igreja como instituição divinamente ordenada, mas suas abordagens exacerbaram divisões que marcaram a história religiosa e política da Inglaterra.
Filho único de William Laud, um comerciante de tecidos, e Lucy Webbe, Laud foi educado na Reading School antes de ingressar no St John’s College, Oxford, em 1589. Sob a orientação de Thomas Holland e John Buckeridge, destacou-se em teologia, obtendo o grau de Bacharel em Artes em 1594, Mestre em Artes em 1598 e Doutor em Divindade em 1608. Durante seus exercícios para o grau de Bacharel em Divindade em 1604, defendeu que a episcopalidade diocesana era essencial para as verdadeiras igrejas, uma posição que lhe rendeu reprimenda pública de Holland por provocar discórdia com as igrejas reformadas estrangeiras. Ordenado diácono em janeiro de 1601 e sacerdote em abril, serviu como procurador universitário em 1603. Sua ascensão envolveu disputas de patronagem, culminando na sucessão de Buckeridge como presidente do St John’s em 1611, após uma eleição contestada resolvida pela intervenção do rei Jaime I. Como Deão de Gloucester em 1616, Laud introduziu inovações cerimoniais, reposicionando a mesa de comunhão no extremo leste, o que contrariou costumes locais e seu bispo, Miles Smith.
Sob Jaime I, a carreira de Laud progrediu com o apoio de Richard Neile, que garantiu sua nomeação como Bispo de St Davids em 1621, apesar das reservas do rei sobre sua natureza provocadora. Laud consolidou sua influência como confidente de George Villiers, Duque de Buckingham, especialmente após um debate em 1622 contra o jesuíta John Percy, assumindo um papel central como conselheiro religioso. Sua ascensão acelerou-se sob Carlos I, que compartilhava sua visão de uma igreja hierarquicamente estruturada. Transferido para Bispo de Bath e Wells em 1626 e nomeado Deão da Capela Real, Laud priorizou a oração litúrgica em detrimento da pregação, alinhando-se às preferências de Carlos. Em 1628, tornou-se Bispo de Londres, liderando a facção “laudiana”. Como Arcebispo de Canterbury a partir de 1633, implementou a uniformidade por meio de censura rigorosa e visitações, nomeando clérigos alinhados para executar suas reformas.
A influência política de Laud cresceu ao lado de Thomas Wentworth, com quem defendeu a política de “Thorough”, marcada por uma autoridade real intransigente. Sua desconfiança nas negociações parlamentares e defesa do prerrogativa real, especialmente em questões fiscais, geraram oposição. A censura de obras puritanas, como Histriomastix de William Prynne, e a perseguição de dissidentes na Câmara Estrelada, incluindo a punição de Prynne, John Bastwick e Henry Burton em 1637, intensificaram o descontentamento público. Suas tentativas de silenciar críticos, como o Bispo John Williams, foram contraproducentes, pois Williams apoiou seu impeachment. O Longo Parlamento de 1640 acusou Laud de traição, prendendo-o na Torre de Londres. Seu julgamento em 1644 não conseguiu provar atos específicos de traição, mas uma lei de attainder levou à sua decapitação em Tower Hill, apesar de um perdão real. A execução, realizada por Richard Brandon, marcou o fim trágico de sua busca inflexível pela ordem eclesiástica.
O legado de Laud é complexo, ancorado em sua crença de que a sucessão apostólica e o culto sacramental refletiam a vontade divina. Suas reformas, que valorizavam a beleza no culto e a autoridade episcopal, anteciparam o anglicanismo de “alta igreja”, mas alienaram os puritanos, que viam suas políticas como cripto-católicas. Comemorado em 10 de janeiro pela Igreja da Inglaterra e pela Igreja Episcopal dos Estados Unidos, seus trabalhos, publicados em sete volumes entre 1847 e 1860, revelam um teólogo dedicado à continuidade com a igreja primitiva. Sua correspondência com Wentworth e suas inovações litúrgicas demonstram precisão técnica na implementação da visão de Carlos, embora sua inflexibilidade, observada por contemporâneos como Francis Cottington, tenha limitado sua eficácia política. A vida de Laud, marcada por integridade e devoção a uma igreja hierárquica, permanece como testemunho dos desafios de conciliar convicção teológica com realidades políticas em uma Inglaterra dividida.
William Laud (1573–1645) foi um arcebispo inglês e figura influente tanto na Igreja quanto na política de seu tempo. Filho único de William Laud, um comerciante de tecidos, nasceu em Reading, em 7 de outubro de 1573. Estudou na escola pública local e depois ingressou no St John’s College, da Universidade de Oxford, em 1589. Ali, obteve uma bolsa de estudos e, em 1594, formou-se bacharel em artes, conquistando o doutorado em teologia em 1608.
Foi ordenado sacerdote em 1601 e, dois anos depois, tornou-se capelão de Charles Blount, conde de Devonshire. Desde cedo, posicionou-se contra os calvinistas dentro da Igreja Anglicana. Em 1604, chegou a ser repreendido por defender, em sua tese de mestrado, que “não poderia haver Igreja verdadeira sem bispos”, e, dois anos depois, por opiniões consideradas “papistas” em um sermão.
Apesar da resistência em Oxford, suas posições mais “alto-eclesiásticas” (de valorização da autoridade episcopal, da liturgia e da tradição) o favoreceram em outros círculos. A partir de 1607, passou a ocupar cargos eclesiásticos cada vez mais altos: foi vigário, capelão de bispo, reitor e, em 1616, nomeado deão da catedral de Gloucester. Nesse cargo, causou polêmica ao mudar a posição da mesa de comunhão – do centro para o altar-mor – sem consultar o bispo local, que, ofendido, nunca mais voltou à catedral.
Em 1617, acompanhou o rei a uma visita à Escócia e gerou reações negativas ao usar sobrepeliz (veste clerical associada à liturgia formal). Em 1621, foi nomeado bispo de St David’s, e renunciou à presidência do St John’s College.
Em 1622, a pedido do rei, participou de um debate com o jesuíta John Percy (conhecido como “Fisher”) para impedir que a condessa de Buckingham se convertesse ao catolicismo. Suas opiniões, expressas nesse embate, revelam amplitude e equilíbrio: apesar de rejeitar a Igreja de Roma como “a verdadeira Igreja”, reconheceu que ela fazia parte da Igreja Católica (universal), mas alertou para os perigos de se conviver conscientemente com o erro. Para ele, a autoridade final da fé não era uma igreja específica, mas a Bíblia; e, em caso de divergência, o julgamento caberia a um concílio livre e legítimo, guiado pelas Escrituras.
A partir daí, estabeleceu uma relação próxima e improvável com George Villiers, o influente duque de Buckingham, o que impulsionou ainda mais sua carreira. A grande virada veio com a morte de Jaime I, em 1625. O novo rei, Carlos I, passou a favorecer livremente os planos ambiciosos de Laud. Este logo elaborou para o rei uma lista do clero inglês, marcando com “O” os ortodoxos (a serem promovidos) e com “P” os puritanos (a serem marginalizados). Defendeu publicamente o teólogo Richard Montague, que atacava o calvinismo, e apoiou o rei no embate com o Parlamento.
Laud assumiu o bispado de Bath and Wells em 1626 e, dois anos depois, tornou-se bispo de Londres. Em 1629, foi nomeado chanceler da Universidade de Oxford.
Nesse papel, brilhou ao promover reformas profundas no ensino e na moralidade da universidade. Regulamentou os estatutos, tornou obrigatórias as provas públicas para obtenção de diplomas e reforçou o uso de trajes acadêmicos e a disciplina religiosa. Fundou ou financiou cátedras importantes – como as de hebraico e árabe – e o cargo de orador público. Incentivou estudiosos ingleses e estrangeiros (como Voss, Selden e Jeremy Taylor), fundou a gráfica universitária e conseguiu para Oxford o direito exclusivo de impressão em 1633. Também expandiu a Biblioteca Bodleiana com mais de 1.300 manuscritos e mandou construir uma nova ala para abrigá-los.
Durante seu governo, o número de estudantes cresceu significativamente. Ele também foi considerado o “segundo fundador” do St John’s College, ao construir novos edifícios. Laud escreveu a história de sua própria administração, e seu estilo de governo se tornou referência em Oxford por gerações. Fora da universidade, também foi um benfeitor: visitava escolas como Eton e Winchester, financiou a escola de gramática de Reading (onde estudara) e liderou uma campanha para restaurar a catedral de São Paulo, em Londres, que estava em ruínas.
Esse perfil revela um homem profundamente religioso, firme em suas convicções e reformador determinado, mas também alguém que, por sua inflexibilidade e autoritarismo, geraria forte oposição política e religiosa – o que seria fatal em sua trajetória futura.
Ele foi muito menos eficaz como governante no Estado, demonstrando, como juiz, um espírito tirânico tanto no tribunal da Câmara Estrelada quanto na Alta Comissão. Chegou a ameaçar Felton – o assassino do duque de Buckingham – com o uso da tortura, e teve participação ativa na aplicação de sentenças cruéis, como no caso de Alexander Leighton em junho de 1630 e de Henry Sherfield em 1634. Seu poder aumentou significativamente após seu retorno da Escócia – onde havia acompanhado o rei – com sua promoção ao arcebispado de Cantuária em agosto de 1633. “Quanto ao Estado”, escreveu ele a Wentworth nessa ocasião, “sou a favor do ‘Thorough’” (uma política de controle absoluto).
Em 1636, o Conselho Privado decidiu a seu favor numa disputa sobre sua autoridade como visitante oficial das duas universidades (Oxford e Cambridge). Pouco depois, foi nomeado para a comissão do Tesouro e para o comitê do Conselho Privado responsável por assuntos exteriores. Laud tornou-se, assim, todo-poderoso, tanto na Igreja quanto no Estado. Ele começou a impor à força os rituais e práticas religiosas que considerava essenciais. Seu vigário-geral, Sir Nathaniel Brent, percorreu as dioceses de sua província registrando qualquer sinal de decadência ou irregularidade. A pregação deixou de ser o centro do culto, dando lugar à mesa da comunhão. Os pregadores puritanos foram silenciados.
Laud demonstrou forte hostilidade ao sabatismo puritano e apoiou a reedição do Livro de Esportes, extremamente ofensivo aos puritanos. Repreendeu severamente o juiz-chefe Richardson por tentar impedir as festas populares no condado de Somerset. Insistiu que os soldados ingleses a serviço da Holanda usassem o livro de orações e forçou os comerciantes ingleses da cidade de Delft a seguir estritamente a liturgia anglicana – tentou até alcançar os colonos da Nova Inglaterra. Quis obrigar os refugiados holandeses e franceses na Inglaterra a se unirem à Igreja Anglicana, propondo taxação em dobro e outras formas de perseguição.
Em 1634, os juízes de paz foram instruídos a entrar nas casas à procura de pessoas reunidas em cultos privados (conventículos) e levá-las perante os comissários. Laud se comprazia em exercer seu poder sobre nobres e figuras influentes, punindo-os por ofensas morais nos tribunais eclesiásticos. Em 1637, participou da sentença do tribunal da Câmara Estrelada contra Prynne, Bastwick e Burton, e também da acusação contra o bispo Williams. Incentivou Strafford a aplicar na Irlanda as mesmas reformas e punições.
Laud agora pretendia estender seu sistema eclesiástico à Escócia, cujas igrejas o desagradaram profundamente durante suas visitas. Um novo livro de orações e um novo código canônico foram redigidos pelos bispos escoceses com sua ajuda e impostos ao país. Apesar de oficialmente não estar à frente do projeto, Laud era corretamente visto como seu verdadeiro autor. Esse ataque não apenas à religião nacional, mas à independência da Escócia, tornou-se o ponto de ruptura de um sistema já pressionado, que não suportou e desmoronou.
Até o fim, Laud continuou apoiando as medidas autoritárias de Strafford e do rei. Durante a reunião do comitê dos oito, em 5 de maio de 1640, falou a favor da continuidade vigorosa da guerra e do uso de qualquer meio para sustentá-la. “Tentaram todos os caminhos – e recusaram todos”, dizia a nota de seu discurso. “Pela lei de Deus e dos homens, vocês devem ter sustento – e é lícito tomá-lo.”
Embora a princípio se opusesse à permanência da convocação (Convocation, assembleia eclesiástica) após a dissolução do Parlamento – por receio das reações –, ele promoveu a aprovação de novos cânones que reforçavam tanto seu sistema eclesiástico quanto o direito divino do rei. A oposição a esse poder passou a implicar “condenação”. A política obstinada de Laud chegou ao extremo com o infame “juramento do etcétera”, que obrigava diversas classes sociais a jurar fidelidade perpétua à “governação desta Igreja por arcebispos, bispos, decanos, arquidiáconos, etc.” – o que gerou zombarias por anos.
Seu poder então desmoronou rapidamente. Foi acusado e atacado como o principal responsável pelos problemas do país. Em outubro, o rei ordenou que suspendesse o juramento do etcétera. No mesmo mês, quando o tribunal da Alta Comissão foi invadido por uma multidão, Laud não conseguiu convencer a Câmara Estrelada a punir os responsáveis. Em 18 de dezembro, foi oficialmente acusado pelo Parlamento Longo e, em 1º de março, foi preso na Torre de Londres.
No dia 12 de maio, a pedido de Strafford, Laud apareceu na janela de sua cela para abençoá-lo no caminho da execução e desmaiou ao vê-lo passar. Durante algum tempo, permaneceu esquecido na prisão. No dia 31 de maio de 1643, porém, Prynne recebeu ordens do Parlamento para vasculhar seus papéis, e publicou uma versão mutilada de seu diário. As acusações formais chegaram à Câmara dos Lordes em outubro, e o julgamento começou em 12 de março de 1644. Como foi impossível incriminá-lo por alta traição de forma legal, optaram por uma bill of attainder (condenação legislativa sem julgamento justo), enviada aos Lordes em 22 de novembro. Não houve qualquer respeito pela legalidade: os Lordes cederam em 4 de janeiro de 1645 às ameaças da Câmara dos Comuns, que se arrogava o direito de declarar qualquer crime como alta traição.
Laud apresentou o perdão real que o rei lhe havia concedido em abril de 1643, mas este foi rejeitado. Ele conseguiu, com dificuldade, que seu pedido para ser executado com o machado – e não pelo suplício brutal reservado aos traidores – fosse aceito. Foi executado em 10 de janeiro na Colina da Torre, declarando sua inocência perante qualquer crime conhecido pela lei, rejeitando a acusação de “papismo” e afirmando que sempre viveu como membro da Igreja Protestante da Inglaterra. Foi enterrado no coro da igreja de All Hallows, Barking, de onde seu corpo foi transferido em 24 de julho de 1663 para a capela do St John’s College, Oxford.
Laud nunca se casou. Fuller o descreveu como “baixo de estatura, franzino, com um semblante alegre (em que se misturavam seriedade e vivacidade), olhos penetrantes e vivos, julgamento claro e, salvo os efeitos da idade, boa memória”. Sua personalidade, por estar fortemente ligada às divisões religiosas da época, raramente foi analisada com imparcialidade. Suas ações severas não vinham de um espírito vingativo, mas de uma mente limitada, e muitos exageraram o número e a gravidade dessas ações. Sua trajetória se destacou pela integridade, piedade, senso de dever, coragem e coerência. Em especial, a acusação de que ele simpatizava com o catolicismo romano é infundada.
No entanto, o contexto da época ajuda a entender os receios em torno dele. Havia diversas propostas de união entre a Igreja da Inglaterra e Roma em circulação. Missões católicas como a de Panzani e, depois, a de Conn, vinham atraindo membros da Igreja Anglicana – pessoas que, como o próprio Laud, estavam insatisfeitas com a tendência puritana dominante. Laud chegou a relatar que foi convidado duas vezes a se tornar cardeal. Havia também movimentos católicos ganhando força na corte real. E, embora as reformas litúrgicas promovidas por Laud tivessem limites claros em sua intenção, elas acabaram aproximando a prática anglicana da tradição romana, o que justificava os temores dos seus contemporâneos.
Laud negligenciou completamente o sentimento nacional, acreditando que o uso da força bastaria para controlá-lo. Essa falha revela sua total ausência de senso político. Muitos estudiosos afirmam que a revolta contra o poder autoritário da monarquia teve como principal motivação não a violação das liberdades constitucionais, mas a rejeição às “inovações religiosas” – e, nesse sentido, Laud foi ainda mais responsável pela crise que se instalou do que figuras como Strafford, Buckingham e até o próprio rei Carlos I.
Laud defendia com firmeza a ideia de que a Igreja da Inglaterra era uma expressão da Igreja universal, conectada historicamente aos apóstolos. Mas sua forma autoritária de governar teve o efeito oposto ao desejado: acentuou o separatismo e o espírito de independência que acabariam triunfando. Além disso, afastou muitos fiéis da vida da Igreja e até da convivência no próprio país. Os colonos que migraram para Massachusetts em 1629 – movimento que seguiu até 1640 – não eram separatistas, mas episcopais anglicanos. Ou seja, Laud destruía com uma mão o que construía com a outra.
Quando se observa sua influência indireta sobre a época, nota-se a limitação de seu pensamento e de seus objetivos – o que o diferencia de um homem como Strafford, que, apesar de também autoritário, tinha visão e idealismo. O que mais caracterizou o governo de Laud foi sua obsessão por detalhes, dando enorme importância até aos mais triviais, sem se apoiar em princípios profundos. Sua visão era fundamentalmente material. Para ele, o essencial na Igreja era sua presença visível. Isso explicava seu forte antagonismo ao conceito puritano e não conformista de Igreja, que não possuía forma externa definida. Daí sua insistência na conformidade externa, nos rituais e nas cerimônias, que ele acreditava deverem ser uniformes a qualquer custo. Em contraste, Laud era mais flexível e tolerante em relação à doutrina e às crenças pessoais. Chegou, por exemplo, a conquistar o pensador John Hales por meio de diálogos amigáveis, e incentivou a publicação do livro A Religião dos Protestantes, de William Chillingworth.
Laud não era um fanático religioso, mas sim um disciplinador rigoroso. Para ele, a forma externa da religião vinha antes da dimensão espiritual – e era até mesmo a base dessa espiritualidade. Em suas últimas palavras, no cadafalso, ele fez referência às calúnias e perigos que enfrentou por tentar manter a uniformidade no culto externo a Deus. A visão de Bacon, que via a Igreja como uma união espiritual baseada na diversidade e na liberdade, era algo totalmente incompreensível para Laud.
Esse materialismo estreito foi a verdadeira causa da influência desastrosa de Laud, tanto na Igreja quanto no Estado. Em sua própria vida pessoal, esse traço resultou em certo embotamento do senso moral, o que explica os poucos episódios de sua carreira que realmente exigem uma defesa ética. Um deles foi a celebração do casamento entre seu primeiro patrono, Lorde Devonshire, e a amante deste – uma mulher que havia sido casada com Lorde Rich e se divorciado. Esse ato contradizia frontalmente os princípios que o próprio Laud professava. Outro exemplo foi sua estranha proximidade com Buckingham, além de seu evidente apego ao poder e aos cargos de prestígio.
Seu desejo pessoal de ascensão se misturava com a ambição de ver a Igreja fortalecida e dominante dentro do Estado. Laud ficou particularmente entusiasmado com a infeliz nomeação do bispo Juxon para o cargo de lorde tesoureiro, em 1636. “Nenhum eclesiástico ocupava esse cargo desde o tempo de Henrique VII”, exclamou com alegria, “... e agora, se a Igreja não se sustentar com a ajuda de Deus, eu nada mais posso fazer”. Para Laud, a influência espiritual da Igreja não era suficiente. Ele não via a Igreja apenas como guia da nação em questões morais e religiosas, ou como mediadora nos assuntos do Estado. Para ele, a Igreja precisava de poder concreto, visível – ocupar cargos elevados no governo, controlar posições estratégicas na administração pública.
Essa postura fez com que a Igreja descesse ao campo da política, tornando-se identificada com as ideias de apenas um dos partidos do Estado – ideias que eram malvistas pela maior parte da população. Ao se associar também a atos de violência e injustiça, a Igreja perdeu ao mesmo tempo seu prestígio e sua autoridade moral. Para o Estado, as consequências foram igualmente desastrosas: o governo do rei passou a ser identificado com apenas um setor da Igreja – e esse setor, além de estar em minoria no país, era minoritário até mesmo entre o próprio clero.
Bibliografia – As obras completas de Laud estão reunidas na Library of Anglo-Catholic Theology (7 volumes), incluindo seus sermões, cartas, a história de sua atuação como chanceler, o relato das perseguições que sofreu e de seu julgamento, e seu notável diário – sendo que os manuscritos desses dois últimos estão sob custódia da St John’s College. Avaliações modernas sobre sua trajetória podem ser encontradas em Life of Laud, de T. Longueville (escrito por um recusante católico, 1894); nas Congregational Union Jubilee Lectures, vol. I (1882); no ensaio Essay on Laud, de J. B. Mozley; em Archbishop Laud, de A. C. Benson (1887); Wm. Laud, de W. H. Hutton (1895); e Archbishop Laud Commemoration, editado por W. F. Collins (contendo conferências, bibliografia e catálogo de exposições, 1895). Também são relevantes as obras Lives of the Archbishops of Canterbury, de Hook, e Archbishop Laud and Priestly Government, de H. Bell (1907).
Fonte: Britannica (Philip Chesney Yorke).