John Polkinghorne (1930-2021), John Charlton Polkinghorne, nascido em 16 de outubro de 1930 em Weston-super-Mare, Inglaterra, e falecido em 9 de março de 2021, aos 90 anos, foi um físico teórico, teólogo e sacerdote anglicano cuja vida integrou com rara profundidade a investigação científica e a reflexão espiritual. Reconhecido como uma voz proeminente na articulação entre ciência e religião, Polkinghorne ocupou a cátedra de física matemática na Universidade de Cambridge de 1968 a 1979, antes de renunciar para se preparar para o sacerdócio, sendo ordenado em 1982. Serviu como presidente do Queens’ College, Cambridge, de 1988 a 1996, e sua obra intelectual, composta por cinco livros sobre física e vinte e seis sobre ciência e fé, inclui títulos como The Quantum World (1989) e Quantum Physics and Theology (2005). Agraciado com o título de Cavaleiro Comandante do Império Britânico em 1997 e com o Prêmio Templeton de £1 milhão em 2002, por suas contribuições à dimensão espiritual da vida, Polkinghorne deixou um legado que harmoniza rigor técnico com uma visão cristã do cosmos.
Filho de George Polkinghorne, funcionário dos correios, e Dorothy Charlton, filha de um cavalariço, John foi o terceiro filho de uma família marcada por perdas precoces: sua irmã Ann faleceu aos seis anos, um mês antes de seu nascimento, e seu irmão Peter morreu em 1942, durante a Segunda Guerra Mundial, servindo na Força Aérea Real. Educado inicialmente em Street, Somerset, e depois em uma escola quaker, Polkinghorne ingressou na Elmhurst Grammar School aos 11 anos. Em 1945, com a promoção de seu pai a chefe dos correios em Ely, transferiu-se para a The Perse School, em Cambridge. Após cumprir o serviço militar no Corpo Educacional do Exército Real entre 1948 e 1949, estudou matemática no Trinity College, Cambridge, graduando-se como Senior Wrangler em 1952. Obteve seu doutorado em física em 1955, sob orientação de Abdus Salam, no grupo de Paul Dirac, consolidando sua formação em mecânica quântica.
A carreira científica de Polkinghorne foi distinta. Após casar-se com Ruth Martin, também matemática, em 1955, passou um ano na Califórnia, trabalhando com Murray Gell-Mann no Caltech. Em 1956, assumiu um cargo de docente na Universidade de Edimburgo, retornando a Cambridge em 1958 como professor. Promovido a reader em 1965 e a professor de física matemática em 1968, contribuiu para a descoberta do quark, investigou integrais de Feynman e a teoria da matriz S, orientando alunos como Brian Josephson e Martin Rees. Eleito Fellow da Royal Society em 1974, colaborou com instituições como Princeton, Berkeley, Stanford e CERN. Contudo, em 1977, sentindo que suas maiores contribuições científicas haviam sido feitas e movido por uma fé cristã que sempre guiara sua vida, decidiu estudar teologia em Westcott House, Cambridge. Ordenado sacerdote em 1982, serviu como vigário em Bristol e Blean, Kent, antes de retornar a Cambridge como deão da capela do Trinity Hall em 1986 e presidente do Queens’ College.
Como teólogo, Polkinghorne dedicou-se a explorar a convergência entre ciência e religião, defendendo o realismo crítico: a ideia de que ambas buscam a verdade sobre uma mesma realidade, apesar de suas abordagens distintas. Em suas obras, propôs cinco pontos de comparação entre ciência e teologia, incluindo revisões radicais, períodos de confusão e sínteses que ampliam a compreensão. Rejeitando visões mecanicistas, como as de Laplace ou Dawkins, argumentava que a natureza é mais semelhante a uma nuvem do que a um relógio, sugerindo uma causalidade mais complexa, descrita por ele como “informação ativa”. Adotando o monismo de duplo aspecto, via mente, alma e corpo como expressões de uma única realidade, desafiando dualismos materialistas. Para Polkinghorne, a inteligibilidade do universo, sua sintonia antropocêntrica e a existência de valores éticos e estéticos apontavam para um propósito divino, sendo a questão da existência de Deus a mais fundamental sobre a natureza da realidade. Embora cético quanto ao argumento ontológico de Anselmo, considerava o teísmo mais coerente que o ateísmo para explicar a complexidade do cosmos e da experiência humana.
Como cristão, Polkinghorne via a fé como um chamado à verdade, nunca abandonando a busca por coerência que marcara sua carreira científica. Defendia a liberdade humana e processual, argumentando que um mundo com escolhas, mesmo que marcadas pelo pecado, é preferível a um determinismo rígido. Rejeitava o criacionismo literal, mas afirmava a criação como expressão da mente divina, em sintonia com a ciência evolucionária. Sua atuação pública incluiu participação no Sínodo Geral da Igreja da Inglaterra, na Comissão de Doutrina e na Sociedade Internacional para Ciência e Religião, da qual foi presidente fundador. Como cânone teólogo da Catedral de Liverpool de 1994 a 2005, continuou a integrar sua vocação pastoral com reflexões acadêmicas, ministrando palestras Gifford em 1993-1994, publicadas como The Faith of a Physicist.
Polkinghorne enfrentou críticas. Filósofos como Simon Blackburn questionaram sua preferência por explicações baseadas em agência divina, enquanto Richard Dawkins via suas crenças cristãs, como a ressurreição, com ceticismo. A. C. Grayling criticou a associação de Polkinghorne com a Royal Society para promover suas ideias. Contudo, cientistas como Freeman Dyson elogiaram a coerência de seus argumentos, e historiadores como Edward B. Davis destacaram sua habilidade em navegar entre fundamentalismo e modernismo. Polkinghorne respondia com serenidade, lamentando a falta de diálogo com críticos como Dawkins, mas mantendo que sua fé, embora desafiada por dúvidas, era inegociável. Sua morte em 2021 marcou o fim de uma trajetória que, com elegância intelectual e compromisso espiritual, iluminou o diálogo entre ciência e religião, oferecendo um modelo de integração para gerações futuras.