Alisson Henrique

Publicado em Dux Neutrorum.

Big Bang

quinta-feira, 25 de julho de 2024

Em nenhum argumento teísta para a existência de Deus o "Big Bang" se dá como premissa para que o argumento funcione. Na verdade, ele se dá como mera consequência dedutiva de certas premissas anteriores. O ateu contemporâneo faz de tudo para evitar a teoria do Big Bang, pois esta, segundo os próprios ateus, corrobora para o início cósmico a partir do nada e, consequentemente, uma causa. O esforço do ateu está para "inventar" uma nova teoria que possa suprimir a necessidade do início do universo, embora quase todos admitem que a teoria mais convincente seja o próprio Big Bang. Mas, para meia duzia de "teólogos", o Big Bang deve ser refutado.

Tesouro sem valor?

segunda-feira, 15 de julho de 2024

Suponha que você está caminhando por algum terreno qualquer até o momento que você acha algo que parece ser um tesouro ali escondido. Para sua boa sorte, o terreno está à venda na Olx e você crê que possui uma quantidade de bugigangas equivalente ao preço do terreno – que possui um preço justo, diferentemente dos quais temos testemunhado nos dias atuais. Sua inferência mais provável certamente seria "vou vender minhas bugigangas e talvez sacar meu FGTS para comprar o terreno sem parcelas". E é isso o que você faz. Embora isso possa parecer mais um caso Gettier, meu foco aqui é o tesouro em si, sua relevância para você adquirir o terreno no qual ele subjaz.

Pronto, finalmente o terreno e, consequentemente, o tesouro, são seus. O que você faz agora? Você começa a escavar (se é que o tesouro está coberto por terra), a investigar qual a utilidade de toda essa riqueza. Você acha aparelhos ultra tecnológicos que são capazes de fazer um cego ver. Outros que são capazes de fazer um paralítico andar. Ainda outro que multiplica pães e peixes. Para sua surpresa, há uma máquina com engenharia perfeita o suficiente para transformar um coração de pedra em um coração de carne. Dá ainda, entre todos os outros aparatos que lhe é cognoscível, algo mais claro e real do que a aquilo que você jamais experimentou; algo capaz de fazer você perceber quem você realmente era antes de achar o tesouro. Para sua surpresa, você estava morto pois descobre que o próprio tesouro é idêntico em essência a Vida. Logo, você adquire a crença de que quem não possui esse tesouro, está realmente morto e isso na verdade implica uma morte espiritual como um zumbi que está em movimento mas não possui qualquer motivação aprazível, que realize um bem devido.

Agora imagine que em vez de utilizar todos esses aparelhos ultra tecnológicos você, ao "comprar" o terreno, o cerca de muros altíssimos ou enterra o tesouro talvez por ter visto apenas a "ponta do iceberg", ou ainda por não ter ficado claro que a proximidade do tesouro lhe garante a Vida, pois como foi escrito acima, o tesouro é a própria Vida. Não seria desprezível alguém que, tendo tamanho tesouro como sua propriedade, sai para brincar com pedras inanimadas, galhos, ou ainda folhas secas que subjazem sobre o mesmo terreno?

Ora, é tolice comprar um Meade LX850 unicamente para usar a embalagem para guardar tralhas; ou ainda comprar uma esteira para usar de cabide. Dá mesmo forma é uma tolice notável "achar" um tesouro, e não o utilizar em favor próprio e/ou favor de outros.

J. R. Lucas contra a igualdade

terça-feira, 25 de junho de 2024

O filósofo cristão J. R. Lucas foi por muitos anos professor da Universidade de Oxford, apesar de não ter seu trabalho devidamente reconhecido, sem dúvidas foi um dos filósofos mais influentes e originais do século XX, sobretudo pela abrangência de seu trabalho, que engloba filosofia da religião, filosofia do tempo, filosofia política, inteligência artificial, entre outros.

Já antevendo a polêmica diabólica do século XXI, escreveu um artigo denominado "Against Equality" para criticar a ideia de igualdade absoluta em termos sociais e políticos. Lucas basicamente argumenta que a igualdade como um princípio absoluto é impraticável e indesejável. Na verdade, ele afirma que um dos deuses modernos é esta tal de "igualdade", que "todos" querem, mas ninguém é capaz de dizer o que isso significa na realidade. Eis aqui alguns pontos principais de sua argumentação.

Lucas acredita que os seres humanos são inerentemente diversos em habilidades, talentos e interesses. Tentar impor uma igualdade absoluta ignoraria essa diversidade natural e poderia levar a injustiças ao tratar desigualmente os desiguais. Ele defende que reconhecer diferenças em mérito e desempenho é crucial para a motivação e o progresso. Uma sociedade que ignora essas diferenças pode desincentivar o esforço e a inovação, resultando em mediocridade generalizada. 

Lucas faz uma distinção entre igualdade e equidade. Ele argumenta que a verdadeira justiça não significa tratar todos igualmente, mas sim tratar as pessoas de acordo com suas necessidades e contribuições. A equidade leva em consideração as circunstâncias individuais e visa resultados justos, ao invés de uma igualdade rígida. Ele também aponta que a busca pela igualdade absoluta pode entrar em conflito com a liberdade individual. Restringir a liberdade para forçar a igualdade pode levar a uma sociedade autoritária, onde o controle centralizado suprime as diferenças individuais e a liberdade de escolha.

Além de questões morais e filosóficas, Lucas questiona a viabilidade prática de alcançar a igualdade absoluta. Ele argumenta que os esforços para nivelar a sociedade podem resultar em burocracia excessiva e ineficiência, sem alcançar os objetivos desejados.

No geral, Lucas não se opõe à igualdade de oportunidades ou ao tratamento justo, mas critica a ideia de que todos os resultados devem ser iguais, independentemente das circunstâncias individuais. Ele acredita que uma abordagem mais equilibrada, que reconheça e acomode as diferenças individuais, é mais desejável e justa.

Já em outro artigo, com o nome de "Vive la Différence", J. R. Lucas explora a importância e o valor das diferenças entre os seres humanos, tanto em termos individuais quanto entre os sexos. Ele argumenta que essas diferenças são fundamentais para a riqueza da experiência humana e para o funcionamento harmonioso da sociedade. 

De acordo com Lucas, homens e mulheres possuem diferenças biológicas e psicológicas que influenciam suas experiências e comportamentos. Ele argumenta que reconhecer e valorizar essas diferenças é essencial para entender a natureza humana e para construir uma sociedade que respeite as contribuições de todos. Em vez de ver as diferenças como fonte de desigualdade, Lucas as vê como complementares. Ele sugere que as qualidades e habilidades distintas de homens e mulheres podem se complementar mutuamente, criando uma dinâmica social e familiar mais rica e equilibrada. 

Lucas defende que as diferenças são fundamentais para a identidade individual. Negar ou minimizar essas diferenças pode levar à perda de autenticidade e à homogeneização da sociedade, o que empobrece a experiência humana. Similar ao que discute em "Against Equality", Lucas critica o igualitarismo radical que tenta eliminar todas as diferenças. Ele argumenta que tal abordagem ignora a complexidade da natureza humana e pode resultar em injustiças e repressão. Lucas enfatiza a importância de celebrar e valorizar as diferenças em vez de tentar eliminá-las. Ele acredita que uma sociedade verdadeiramente justa e humana reconhece e honra as variações entre indivíduos e grupos. 

Lucas também aborda a questão dos papéis sociais e como estes podem ser influenciados pelas diferenças sexuais. Ele sugere que, embora seja importante lutar contra estereótipos prejudiciais e discriminação, também é necessário reconhecer que algumas diferenças podem naturalmente levar a diferentes inclinações e escolhas de vida.

No geral, "Vive la Différence" é uma defesa das diferenças naturais entre os seres humanos e um apelo para que estas sejam reconhecidas e valorizadas em vez de suprimidas. Lucas argumenta que uma sociedade saudável e justa é aquela que celebra a diversidade e permite que todos os indivíduos contribuam de acordo com suas capacidades e inclinações únicas.

O resumo da ópera é que ele argumenta o que quase todo mundo já sabe, mas poucos lucram. Embora ele utilize de distintas referências, e uma condição intelectual mais privilegiada, supremacista e... Ops.

Um dualismo de substância

quarta-feira, 13 de dezembro de 2023

No artigo "The Immaterial Aspects of the Thought", James Ross argumenta que alguns aspectos do pensamento são imateriais. Ele baseia seu argumento na ideia de que alguns pensamentos são determinados entre funções incompatíveis, de uma forma que nenhum processo físico, série de processos ou função fisicamente determinada entre processos pode ser. O resultado é que tal pensamento nunca é idêntico a nenhum processo ou função física.

Para ilustrar seu argumento, Ross usa o exemplo da adição. Ele argumenta que, quando adicionamos dois números, não estamos simplesmente seguindo uma série de regras físicas ou computacionais. Em vez disso, estamos aplicando um conceito abstrato de adição, que é independente de qualquer processo físico específico.

Ross também argumenta que nossos pensamentos são muitas vezes intencionais, ou seja, eles são dirigidos para um objeto específico. Ele sustenta que essa intencionalidade não pode ser explicada por processos físicos, pois os processos físicos não são intencionais por natureza.

Além do exemplo da adição, Ross também utiliza outros exemplos no artigo para ilustrar seu argumento. Um desses exemplos é o da compreensão de uma metáfora. Ele argumenta que, quando compreendemos uma metáfora, não estamos simplesmente seguindo uma série de regras físicas ou computacionais. Em vez disso, estamos fazendo uma conexão entre dois conceitos que são, em princípio, incompatíveis.

Outro exemplo utilizado por Ross é o da criatividade. Ele argumenta que, quando somos criativos, não estamos simplesmente seguindo um modelo físico ou computacional. Em vez disso, estamos produzindo algo novo e original.

Ross também argumenta que nossos pensamentos são muitas vezes subjetivos, ou seja, eles são experimentados de uma forma única por cada indivíduo. Ele sustenta que essa subjetividade não pode ser explicada por processos físicos, pois os processos físicos são objetivos por natureza.

Por fim, Ross argumenta que nossos pensamentos são conscientes, ou seja, somos conscientes de que estamos pensando. Ele sustenta que essa consciência não pode ser explicada por processos físicos, pois os processos físicos não são conscientes por natureza.

Sentido

segunda-feira, 5 de junho de 2023

De acordo com um dos magníficos pensamentos de Pascal, os problemas humanos surgem da incapacidade do homem permanecer em repouso, sentado por algum tempo. Isto parece a prima facie um pensamento um tanto estranho de imaginar e até mesmo superficial. Mas Pascal prossegue argumentando que não é o mero repouso inanimado que resolve o caos humano. Muito pelo contrário. Ele indica que o próprio repouso é insuportável pelo tédio que gera. O tédio no repouso é insuportável pelo desespero que gera quando uma reflexão inata é evidenciada em tal repouso: nossa condição leviana, ignorante, miserável, e mortal. "Ele sente então todo o seu nada, seu abandono, sua insuficiência, sua dependência, sua impotência, seu vazio. Imediatamente nascerão do fundo de sua alma o tédio, o negrume, a tristeza, a mágoa, o despeito, o desespero." O desespero insuportável leva à diversão, que "nos entretém e nos faz viver insensíveis" em relação à essas condições humanas. Sem a diversão, o homem buscaria meios mais sólidos de escapar da morte e sair da ignorância. Mas a ausência de diversão gera tristeza, e para resolver esse caos do desespero humano, a escolha geralmente é parar de pensar nisso. (Parece, ao menos para mim, que a maior inspiração em Dostoiévski – principalmente nos personagens príncipe Mishkin e Aliócha – é seu contato com o realismo de Pascal, mas não trataremos disto agora.)

A resposta de Pascal segue sua jornada até Cristo que, na minha humilde opinião, é com muito peso a única opção razoável para tomar como "aposta". "Apostar" em Deus e, mais especificamente, no Deus cristão – aqui Pascal segue uma linha de teologia natural que justifica o porquê do Deus cristão e não outro Deus que não cabe tratarmos disto agora, mas talvez em uma futura postagem –, é a única saída que satisfaz a necessidade de objetividade de um sentido para todo esse caos e desespero. Objetividade esta que parece ausente nos argumentos de Viktor Frankl, o famoso psiquiatra da Logoterapia, e Jordan Peterson, o famoso psicólogo contemporâneo.

Não parece muito vantajoso ou diferente de uma ilusão (tal como a "ilusão de indulto" de Viktor Frankl) o mero sentido subjetivo. Imagine, por exemplo, que alguém sente uma obrigação moral em ser responsável por salvar vidas em um hospital. (Por um momento acreditei que não seria preciso esclarecer que não estou desmerecendo tal juízo moral, mas acidentes acontecem... e é melhor que fique evidente que não tenho esse nível de desprezo por pessoas responsáveis!) O que um médico realmente faz? Pode, acaso, salvar alguém da morte? Ou não seria mais razoável reconhecer que o trabalho da medicina é – de uma forma um tanto reducionista, eu reconheço – "adiar o inevitável"? Aqui alguns idólatras da ciência aparecem de seus buracos para argumentar em favor de uma espécie de busca científica pela imortalidade do homem. Não pretendo refutar nem rejeitar esse tipo de esforço, mas simplesmente expor, caso necessário, o fatídico evento futuro (e ainda embasado em cosmologia contemporânea fresquinha) de um universo caótico e impossibilitador de vida. Mas peço que para que o raciocínio prossiga, continuemos a pensar sobre nossa morte como inevitável, seja agora, seja daqui a alguns milhares ou milhões de anos. O que o propósito e/ou responsabilidade do doutor vai resolver? Por que alguém gostaria de multiplicar em sua memória, a multiplicação de males gratuitos deste mundo? Não é, por acaso, mais razoável reconhecer o terrível (se verdadeiro) engano do sentido subjetivo? 

Não tenho dúvidas de que a responsabilidade social é algo belo e que devemos ter coragem de assumir estas carências. Mas diminuir o sofrimento não é igual a felicidade, senão uma que é passageira, ilusória. A verdadeira percepção da realidade em seu nível mais cru, foi primeiramente contemplada pelo escritor de Eclesiastes (muito provavelmente Salomão.) Ele percebeu de uma forma um tanto tardia, que nada do que se passa "debaixo do Sol" é novo, e que quase nenhuma vantagem se extrai dos esforços que os homens se afadigam. A verdadeira felicidade é participar da divindade. Pois isto é muito mais do que aqui e agora. E mais uma vez Pascal: "a única boa esperança desta vida é a esperança em uma próxima vida." Ou como William Lane Craig escreve: "Se Deus não existe, você não passa de um aborto da natureza jogado em um universo sem sentido para viver uma vida sem propósito."

Os três estágios da vida por Søren Kierkegaard

sábado, 3 de junho de 2023

– O estágio estético: uma vida no nível sensual em busca de prazer e em torno de si mesmo. O paradoxo do nível estético é que no final ele leva a infelicidade, ainda que os prazeres da alma sejam constantemente satisfeitos. Tal nível não pressupõe uma ignorância intelectual ou cultural, mas que tudo se dá por puro egocentrismo. A pessoa egocêntrica cai em desespero por ausência de significado em seu hedonismo.

– O estágio ético: tendo como ponto de partida o estágio anterior e sua insignificância existencial, o desespero agora se torna o salto entre o nível estético e ético. Aqui surgem motivações para a aderência de valores morais e a tentativa de viver neles de forma objetiva. O homem agora é moral, de um ponto de vista teórico; mas a impossibilidade prática de se viver verdadeiramente neste estágio sem qualquer deslize também leva a culpa e mais tarde, causa desespero e infelicidade.

– O estágio religioso: é neste estágio da existência humana que se encontra perdão de pecados e relacionamento com Deus. O salto do estágio ético para o estágio religioso é agora motivado pela crença em um Deus que perdoa iniquidades pois somente um Deus Criador pode nos dizer objetivamente o que é moral e nos perdoar quando somos incapazes de agirmos moralmente. É neste estágio que está a realização verdadeira humana.

Confiabilidade das funções próprias

segunda-feira, 31 de agosto de 2020

O que se segue, é um argumento teísta probabilístico sobre a confiabilidade de nossas funções próprias, retirado de um artigo no livro "Two Dozens (or so) Arguments fo God".

Teísmo aqui é representado por T; evolução não teísta por NTE (non-theistic evolution). A confluência da função própria e confiabilidade é representado por R (reliability). LoL é a Lei da Probabilidade (Law of Likelihood).

Onde,

LoL: Se Pr (E|H1) >> Pr (E|H2), então E favorece H1 sobre H2. Isto é, se a probabilidade da evidência sobre a hipótese 1 for maior muito maior que a probabilidade da evidência sobre a hipótese 2, então a evidência favorece a hipótese 1 sobre a hipótese 2.

1. Pr (R|T) >> verdadeiramente pequena. (Premissa)

2. Pr (R|NTE) = verdadeiramente pequena. (Premissa)

3. Portanto, Pr (R|T) >> Pr (R|NTE). (A partir de 1 & 2)

4. Se Pr (R|T) >> Pr (R|NTE), então R favorece T sobre NTE. (LoL)

5. Portanto, R favorece T sobre NTE. (De 1 até 4)

O argumento pressupõe que nossas faculdades cognitivas são confiáveis, o que é justo pensar, uma vez que não poderíamos falar sobre qualquer coisa se não tomássemos tal procedimento auto reflexivo como verdadeiro. Se nossas faculdades cognitivas são verdadeiras, então a probabilidade de T é muito mais alta do que a probabilidade de NTE, uma vez que em T a probabilidade de R ter sido intencionalmente direcionado à verdade é muito maior do que NTE.

O argumento da contingência

sábado, 1 de agosto de 2020

O argumento da contingência foi proposto pelo grande matemático, físico e filósofo Gottfried Wilhelm Leibniz, que lançou uma das perguntas mais complexas que eu conheço (Por que existe algo ao invés de nada?), e cuja resposta ele encontrou, por um exercício de raciocínio, que somente Deus (um ser necessário) poderoso poderia criar o Universo (algo contingente). Eis o argumento que li no livro "Two Dozens (or so) Arguments for God", no capítulo "Why is there anything at all?", em sua versão na lógica modal:

Tomemos como axiomas um pouco de lógica modal:

M: □p → p  [se é necessário que p, logo p]

K: □(p → q) → (□p → □q)  [se é necessário que, se p, então q, logo, se é necessário que p, então é necessário que q]

4: □p → □□p  [se é necessário que p, então p é necessariamente necessário]

5: ◊p → □◊p  [se é possível que p, então é necessariamente possível que p]

Vamos usar ‘N’ para abreviar ‘∃x (N(x))’, onde ‘N(x)’ se lê ‘□(∃!(x) & ◊ (∃y (x é a causa de y)))’. Ou seja, N é um ser necessário (Deus) e causa y no mundo atual, e y é contingente (Universo e tudo o mais).

1. Assumamos que ◊N.

2. Então: ◊□N. (□(N → □N), pelos axiomas 4 & 5)

3. Agora suponha (a bem do argumento) que ◊~N.

4. Então: □◊~N. (pelo axioma 5)

5. Então: ~◊~◊~N. (substituindo ‘~◊~’ por ‘□’)

6. Então: ~◊~~□~~N. (substituindo ‘~□~’ por ‘◊’)

7. Então: ◊□N. (porque ‘~~X’ é equivalente a ‘X’)

8. Mas (7) contradiz (2).

9. Logo: (3) não é verdadeiro. ((3) → (8))

10. Logo: ~◊~N.

11. Logo: □N. (substituindo ‘□’ por ‘~◊~’)

12. Logo: N. (□X → X, pelo axioma M)

13: Logo: se ◊N, então N.

A treliça e a videira

segunda-feira, 13 de julho de 2020

Não é muito comum livros de teologia me agradarem. Principalmente por seus procedimentos metodológicos para as interpretações que fazem acerca da Bíblia e a confusão linguística em que habitualmente caem. Para falar a verdade, eu até evito seguir a moda de estabelecer uma meta e ler dezenas de livros por ano pelo simples pensamento de que a maioria dos tais livros poderiam ser muito mais resumidos, ou ficam repetindo coisas que já foram ditas por autoridades teológicas do passado. Penso ser desnecessário ler um livro de centenas de páginas que afirma coisas que já foram anteriormente afirmadas, mas com palavras diferentes; creio, inclusive, que tal modo de escrever acaba poluindo a virtude de apreciar uma boa leitura teológica. Mas não tenho tanto problema com a Teologia em si, mas com teólogos contemporâneos que escrevem em dezenas de livros aquilo que poderiam ter colocado em apenas um.

Mas não se segue, é claro, que creio ser irrelevante todo material teológico produzido em nossos dias. Por acaso, me deparei com um livro que me chamou bastante atenção, seu nome é "a treliça e a videira". A treliça é algo mais ou menos como a estrutura da Igreja, e a própria Igreja (a membresia) é a Videira.

De acordo com os autores – e com as Escrituras, é claro - não há diferença entre ser “um discípulo não envolvido com o discipulado” e “não ser discípulo”, uma vez que “ser discípulo” pressupõe uma participação direta no trabalho da videira. Por isso, é importante "preparar os santos para a obra", como em Efésios 4. Outros pontos são muito notáveis no livro, como não haver justificativa para não congregar e a necessidade de instruir uns aos outros. O compartilhamento do que se aprende é uma função do discípulo, e não algo que cabe apenas à liderança e os pastores da congregação. A manutenção da videira é um trabalho de todos. O melhor exemplo disso aparece quando os tessalônios evangelizavam como se isso fosse um instinto natural, pois eram constantemente questionados sobre a razão de terem mudado de pensamento (reflexo de sua verdadeira conversão). Os autores argumentam que, uma vez que alguém se torna um discípulo (no sentido real e não aparente e teórico da palavra), segue-se necessariamente que estes discípulos falariam acerca de sua fé para outras pessoas. E isso acontece por várias formas, como ler as Escrituras, orar e compartilhar alegrias e tristezas com os irmãos.

O livro tem ótimos trechos, que são bem evidentes, mas nem sempre estão imediatamente em nossos pensamentos, tal como: “O cristão que não tem um coração missionário é uma anomalia.”

Um pouco mais pra frente, há uma simples justificativa para tornar justa a ideia de que devemos incentivar-nos uns aos outros a participar da obra como igreja: é assim que a Bíblia determina que seja feito. A unidade dos discípulos no Evangelho nos torna responsáveis uns pelos outros. E mais adiante, os autores propõem que um treinamento, no padrão bíblico, é um treinamento para agir de acordo com as Escrituras para alcançar objetivos. Paulo desenvolve uma espécie de treinamento em suas cartas do verdadeiro discipulado. O livro apresenta alguns estágios no crescimento do evangelho: evangelização, acompanhamento, crescimento, treinamento. 

Também aborda as diferentes ideias do pastorado e como alguns membros se comportam, tal como um cristão consumidor do tempo dos outros para satisfazer as suas próprias necessidades, pensando que só precisa ser servido, mas não possui nenhuma responsabilidade em relação aos irmãos em Cristo. Ainda há o caso das igrejas que adotaram o método “crescimento da igreja”, também oferecendo um produto para os “consumistas” e que não necessariamente implica em crescimento espiritual e mentalidade de discípulo (isso me lembra do termo do Dallas Willard para “vampiro cristão”, definido como “aqueles que querem apenas um pouco do sangue de Cristo”). Em contrapartida, o pastor treinador direciona para que todos os cristãos possam ser responsáveis pelo compartilhamento das responsabilidades da igreja. O serviço do pastor é fazer discípulos que façam mais discípulos. Há também uma ênfase na teologia de Baxter sobre a evangelização pessoal, do qual eu particularmente desconheço, mas é no mínimo interessante.

“Há mais pessoas do que podemos atender”. Os autores oferecem um cálculo lógico para a multiplicação de discípulos, apresentado em uma tabela onde o pastor faz discípulos capazes de fazerem mais discípulos. É necessário haver cooperadores e ministros que se sentem responsáveis a manter discípulos em constante crescimento espiritual. Mais pra frente, é apresentada a tese evidente de que “igrejas não fazem discípulos; discípulos fazem discípulos” e diversos preceitos para selecionar cooperadores para o reino tal como procurar pessoas que tem a mentalidade de trabalhar em prol do evangelho e compreendem perfeitamente as dificuldades que isso exige. E trabalhar para que essas pessoas sejam treinadas em suas convicções, caráter e piedade.

Até onde podemos ver, é evidente que é mais importante o crescimento do Reino de Deus do que o preenchimento dos bancos de uma igreja; portanto, acontecerá que pessoas com as quais gasta-se tempo treinando, futuramente farão discípulos em algum outro lugar diferente daquele em que foi discipulado. 

A grande comissão do discipulado é fazer discípulos capazes de fazerem mais discípulos. Participar de grupos ou ter igrejas cheias não indica que o foco no discipulado está sendo mantido. Entender o que é ser discípulo deve implicar em ser um discípulo. O alvo de toda estrutura da igreja é fazer discípulos. Discípulos produzem mais discípulos. O treinamento do discipulado consiste em uma atenção sobre as convicções, o caráter e a competência do próximo. Embora os membros de uma congregação possuam diferentes papéis dentro do ministério, a função de todos é ser e fazer discípulos. É preciso entender o que está causando a dificuldade de fazer novos discípulos. É preciso treinar pessoalmente e se preocupar com o futuro da igreja, sendo um modelo a ser seguido.

No final do livro encontra-se um trecho que me chamou muito atenção desde o instante que li pela primeira vez, e ainda mais vejo sua importância nos dias atuais. Os autores fazem uma espécie de experimento mental, imaginando a possibilidade de surgir uma pandemia em algum lugar do mundo, onde o governo limitaria o número de pessoas reunidas num mesmo local para no máximo três pessoas e tal decreto do governo entraria em vigência por no mínimo 18 meses. A questão óbvia é que nenhum pastor seria capaz de pastorear uma igreja com algo em torno de 120 membros. Seria extremamente improvável que as pessoas se sentissem pastoreadas com a rara visita do pastor ou ligação semanal ou quinzenal. Há pessoas que não são pastoreadas mesmo quando não há pandemia. Os autores então chamam a atenção para a necessidade de discípulos fazedores de discípulos. É uma pena que tal livro não recebeu tanta atenção e, a possibilidade de haver uma pandemia, algum crédito.

Onde está o conflito?

quinta-feira, 25 de junho de 2020

"Onde está o conflito?" é um dos grandes livros do filósofo analítico contemporâneo Alvin Plantinga. Neste livro ele trabalha exatamente o que o título sugere: há o conflito entre a religião e a ciência ou há um conflito entre o naturalismo e a ciência? Sua tese geral, já apresentada na introdução diz que há sim um certo conflito entre a religião - mais especificamente as religiões teístas como o Cristianismo, o Judaísmo e o Islamismo - e a ciência, mas Plantinga defende que é apenas um conflito superficial; contudo, existe uma profunda concordância entre a ciência e a religião; e ainda, que há pouca concordância mas um profundo conflito entre o naturalismo - tese de que não existe uma entidade divina criadora do universo e que sustenta-o - e a ciência moderna.

É evidente que de nenhuma forma o cristianismo detesta a "ciência". Se assim fosse, os 65% dos ganhadores de prêmios nobel que são cristãos (embora seja verdade que nem todos prêmios desses 65% tenham sido científicos) estariam indo contra essa "lei cristã" de se opor à ciência. Isso para não citar Isaac Newton, Leibniz da Silva e a turma toda do passado que forneceu os pilares da ciência moderna e julgavam na crença da proposição "Deus existe" como verdade. Há quem diga que os medievais (cuja época é ridiculamente chamada Idade das Trevas) eram contra o conhecimento científico e acreditavam que a Terra era plana, e outras baboseiras inseridas no pensamento da época. A questão é que isso é apenas um pequeno grupo desinformado que vive nas redes sociais que tentam se passar por intelectuais. 

Mas será que algum filósofo pode dizer algo relevante sobre mecânica quântica, relatividade geral, psicologia evolucionista, estrutura molecular, complexidade irredutível, e outras tantas teorias científicas que são debatidas nas melhores universidades do mundo? Talvez o filósofo esteja limitado a entender do que se tratam esses assuntos ao invés de partir para o laboratório de realizar seus próprios experimentos, mas isso de nenhuma forma significa que o filósofo não está justificado em apresentar falhas em conclusões da ciência; ou até mesmo qualificar o que realmente é ciência e aquelas meras especulações ou conclusões precoces acerca de alguns resultados da ciência. Neste livro vemos que muitas especulações da ciência são, na verdade, metafísica (muitas vezes de péssima qualidade) e não ciência. Plantinga analisa as conclusões a partir de alguns experimentos científicos, e algumas outras inferências, e expõe com muita claridade a fraqueza de algumas das principais objeções à crença teísta.

Plantinga começa analisando o que seriam as "objeções mais fortes à crença teísta", ou pelo menos as mais famosas. E a mais famosa é a teoria da evolução - a tese de que todos organismos vivos como conhecemos hoje surgiram de um processo adaptativo lento, juntamente com mutações genéticas que conectam todas as espécies. Mas ele também demonstra que as "fortes" objeções dos chamados "cavaleiros do ateísmo", na maioria das vezes, nada mais é do que um argumentum ad derisionem (um nome bonito para um "argumento" via ridicularização). Parece que o que é mais convincente nos argumentos do ateísmo de Dawkins e Dennett, por exemplo, é essa tentativa de tentar ridicularizar a crença no lugar de "buscar a verdade seriamente" (como o próprio Dennett sugere), ignorando mais algumas das grandes respostas proporcionadas por alguns dos milhares de Cristãos que já existiram. Mas é